O médico responde

Perguntas e respostas publicadas na Revista Sem Glúten, na rubrica Perguntas Celíacas, da autoria do Dr. Paulo Oliveira Ratilal.

Dr. Paulo Oliveira Ratilal é médico gastroenterologista, exercendo a sua atividade clínica e endoscópica no Hospital Cuf Descobertas, em Lisboa. Tem especial dedicação à Doença Celíaca, interessando-se por uma abordagem global, nas suas vertentes de diagnóstico, acompanhamento e tratamento.

Envie as suas questões através do e-mail perguntas.celiacas@celiacos.org.pt.

A doença celíaca é uma situação potencialmente complexa cujo diagnóstico e seguimento deve ser efetuado por um médico, com base na história clínica e no resultado de exames complementares de diagnóstico, nomeadamente em análises sanguíneas e na endoscopia com biópsias do duodeno. Esta é a única forma no adulto de definitivamente se excluir, afirmar ou monitorizar uma doença celíaca.

Têm sido divulgados e disponibilizados vários testes “rápidos” para utilização no contexto da doença celíaca, alegadamente no seu rastreio e/ou seguimento através da determinação dos anticorpos*. São testes de variadas marcas, de resultado rápido, de venda livre em estabelecimentos comerciais ou online e que se destinam a ser feitos em casa, pela própria pessoa (autotestes). Genericamente, é necessário colocar uma gota de produto biológico (habitualmente sangue) num compartimento de uma pequena placa e aguardar uns minutos pelo resultado.

Ao avaliar o papel deste tipo de autotestes colocam-se 2 questões principais: uma relativa ao desempenho dos testes e outra relacionada com o seu interesse prático, no rastreio/diagnóstico da doença e no seguimento ao longo do tempo de um celíaco.

Os testes são bons? Ou seja, avaliam bem aquilo a que se propõem?

Estes testes rápidos têm como alvo determinar a existência no sangue (ou na saliva) de anticorpos específicos para a doença celíaca (o transglutaminase tecidular e/ou o gliadina desaminada), nas suas variantes IgA e/ou IgG. Como qualquer outro dispositivo médico comercializado em Portugal, estes autotestes obedecem a exigências específicas em termos de desempenho e segurança e são aprovados pelas autoridades reguladoras. Genericamente, não particularizando qualquer teste, poder-se-á dizer que sim: a tecnologia presente nos testes adequa-se ao objectivo a que se propõem, que é detetar a presença de determinados anticorpos num produto biológico.

Mas os testes têm algum interesse clínico? Ou seja, são úteis no rastreio/diagnóstico ou no seguimento da doença celíaca?

O papel destes testes no rastreio/diagnóstico da doença celíaca limita-se aos resultados positivos (que, claro, carecem sempre de avaliação clínica e de estudo laboratorial para que sejam confirmados e valorizados adequadamente). Um resultado negativo, no contexto de rastreio/diagnóstico, não permite negar a existência da doença e pode mesmo atrasar ou impedir o seu diagnóstico, com repercussões significativas sobre a saúde.

Adicionalmente, como método de seguimento da doença celíaca, estes testes não têm interesse clínico não sendo – exatamente por isso – aconselhados pelas principais sociedades internacionais gastrenterológicas. Assim, a obtenção de um resultado negativo num destes testes não permite, nem ao médico nem ao celíaco, tirar conclusões adequadas sobre o estado da doença:

  • Em alguns autotestes (não são todos iguais), o tipo de anticorpos e de imunoglobulinas alvo que se detetam não têm papel relevante no manejo da doença celíaca no adulto (como o anticorpo antigliadina desamimada – IgG). Assim, trata-se apenas de um resultado negativo num teste, desde o início, não adequado ao estudo da doença;
  • Um resultado negativo num qualquer teste não exclui uma doença celíaca descompensada. Para além dos falsos-negativos, a interpretação dos resultados é condicionada por determinadas situações sendo exemplos um celíaco que não tem qualquer anticorpo específico (sendo sempre negativo, mas com doença celíaca) ou alguém que tem deficiência de IgA (sendo também negativo nos anticorpos-IgA, mesmo com doença celíaca);
  • Um celíaco que obtenha um autoteste negativo fica com a falsa segurança de que a doença está controlada, não sendo isso necessariamente verdade. Não existe obrigatoriamente uma relação estreita entre a subida dos anticorpos e o incumprimento dietético: um celíaco pode erradamente ingerir glúten, manter-se com anticorpos negativos e estar mesmo assim sujeito ao processo destrutivo inflamatório do glúten sobre o seu organismo.

Desta forma, atualmente não se recomendam os autotestes para a doença celíaca, pois a sua utilização poderá colocar em causa o adequado acompanhamento clínico. Sempre que persista alguma questão em relação a esta patologia, esclareça-a com o seu médico assistente.

* Não confundir estes testes rápidos de deteção de anticorpos com outros de deteção de péptidos imunogénicos do glúten na urina, utilizados para estudar o rigor de uma dieta isenta de glúten.

A doença celíaca (DC), no adulto ou na criança, pode ser difícil de diagnosticar essencialmente por dois motivos. Por um lado, podem existir queixas muito ligeiras ou pouco frequentes que não despertam logo essa suspeita diagnóstica. Por outro, os exames médicos de diagnóstico disponíveis têm algumas características especiais, que levam a que a sua interpretação possa ter resultados diferentes de um simples “sim” ou “não”. No entanto, considera-se que deve sempre ser feito um esforço para afirmar ou excluir a DC, uma vez que na presença do diagnóstico a dieta isenta de glúten é de primordial importância. De facto, a instituição precoce desse tratamento eficaz – apenas nutricional e isento de fármacos – parece evitar o aparecimento de outras patologias auto-imunes e de complicações importantes ao longo da vida.

Dos vários exames que ajudam no diagnóstico, para além das análises sanguíneas “de rotina” que podem refletir o estado geral do organismo (nomeadamente em relação à absorção intestinal), salientam-se as análises dos anticorpos e o teste genético (ambos realizados no sangue) e a endoscopia digestiva alta com biópsias do duodeno (primeira porção do intestino). O pedido destes exames deve ser feito de acordo com o caso específico de um indivíduo, podendo existir variações em diferentes pessoas na forma como a investigação é conduzida. Pretende-se reunir toda a informação útil e, no final, perceber se é possível fazer um diagnóstico que idealmente deve ser efetuado com elevada certeza e probabilidade.

Assim, o médico tem à sua disposição o estudo dos anticorpos no sangue, o teste genético e a endoscopia alta com biópsias intestinais:

1. Pesquisa de anticorpos no sangue ou serologia (análise aos anticorpos anti-transglutaminase tissular, anti-gliadina desaminada e/ou anti-endomísio): são considerados muito específicos da DC e alteram-se sob dieta isenta de glúten. O seu estudo é praticamente considerado obrigatório, pois são actualmente de fácil acesso e de relevante interesse no diagnóstico inicial e no seguimento da DC. Na criança (mas não no adulto), se forem fortemente positivos e em determinadas circunstâncias, podem mesmo dispensar a realização de endoscopia com biópsia. Os 3 tipos de anticorpos referidos não são iguais, não têm o mesmo significado e a sua utilização não é indiferente perante determinado caso clínico. Mesmo sendo negativos, porque existem casos de DC sem anticorpos, a investigação perante uma forte suspeita clínica não deve parar por aqui.

2. Teste genético (para os genes HLA-DQ2 e HLA-DQ8): é uma análise que, não sendo obrigatória, se pode revelar útil na investigação, mesmo quando se está sob dieta isenta de glúten pois o resultado não se altera nessa circunstância. A sua utilização baseia-se em dois factos importantes para o raciocínio diagnóstico.

a) Na população geral, cerca de 30% das pessoas têm esta genética positiva. Contudo, desses indivíduos, menos de 1% terá DC. Isto quer dizer que um resultado genético positivo não significa necessariamente que se seja celíaco. Pode-se ter apenas um terreno genético favorável – uma predisposição genética – mas sem nunca expressar a doença;

b) Praticamente todos os celíacos (até 99% em alguns estudos) têm genética positiva, ou seja, têm pelo menos um dos genes da DC. Conclui-se que quem tem genética negativa (não tem nenhum dos genes da DC) não é, com elevado grau de probabilidade, celíaco.

Desta forma, a informação que o teste genético nos fornece é especialmente útil quando este é negativo: permite afirmar que não se tem DC. Quando positivo, não confirma a doença mas deixa tudo em aberto. Por estes motivos (e também porque é dispendioso) o seu pedido deve ser feito de forma criteriosa e de acordo com a situação clínica.

3. Endoscopia alta com biópsias do intestino delgado (duodeno): é um exame obrigatório no adulto para que se possa afirmar o diagnóstico, devendo-se ter sempre presente que a dieta sem glúten influencia os resultados. A observação ao microscópio das biopsias do duodeno permite caracterizar o tipo de inflamação e avaliar o grau de destruição (atrofia) das vilosidades, estruturas primariamente afectadas na DC. Esta análise microscópica pode assim confirmar a existência da DC, excluí-la ou até sugerir outros diagnósticos. Contudo, em alguns casos, o estudo das biópsias pode não ser conclusivo.

Na prática médica, a DC nem sempre é fácil de diagnosticar. Nos casos em que tudo encaixa bem e o puzzle se compõe facilmente, o diagnóstico pode ser muito linear, não precisando sequer do estudo genético: por exemplo, alguém com queixas típicas (diarreia, dor e distensão abdominal e emagrecimento), análises de sangue gerais sugestivas (sinais laboratoriais de má absorção), serologia positiva (nomeadamente anticorpos anti-transglutaminase IgA elevados) e biópsias intestinais mostrando atrofia. Noutros casos pode ser difícil afirmar ou excluir o diagnóstico mesmo recorrendo a todos os exames complementares disponíveis. Por isso, na suspeita de uma doença celíaca e antes de iniciar uma dieta isenta de glúten, deve consultar o seu médico assistente. Assim poder-se-á estabelecer uma estratégia de diagnóstico que optimize as hipóteses de se obter um diagnóstico correcto e fiável.

Cumprir com rigor uma dieta celíaca implica eliminar todas as potenciais fontes de glúten da alimentação. Todo o esforço despendido numa cuidada seleção dos alimentos (observando a regra dos alimentos gluten free, com conteúdo de glúten inferior a 20 partes por milhão ou 20 mg/kg) poderá ser posto em causa por fontes menos óbvias de glúten, nomeadamente através da contaminação cruzada.

Partindo do princípio de que se selecionam corretamente os alimentos e que se tem em conta a informação presente na sua rotulagem, a principal causa de ingestão inadvertida de glúten é a contaminação cruzada. Esta contaminação acontece de forma direta quando um alimento seguro entra em contacto com outro que contém glúten, como por exemplo numa salada à qual foram adicionados pedacinhos de pão crocante ou num gelado no qual se colocou um pau de bolacha no topo. Pode ainda existir contaminação indireta quando o glúten chega ao alimento seguro através das mãos, de um utensílio ou de um equipamento/aparelho, como uma colher de pau ou uma torradeira.  O grau de contaminação poderá, claro, variar, mas sabe-se que mesmo ínfimas quantidades de glúten podem descompensar uma doença celíaca controlada.

Para evitar a contaminação cruzada na cozinha, claro que o mais seguro é que não entre aí glúten algum, tornando-se uma cozinha gluten free. Caso isso não seja possível, há regras básicas de separação, arrumação e acondicionamento dos alimentos com e sem glúten que devem ser cumpridas. Existem também regras que devem também ser respeitadas em relação aos utensílios e equipamentos de forma a não serem veículos de transporte de partículas de glúten em cozinhas mistas, com alimentos com glúten.

No que se refere aos utensílios (loiça de mesa, talheres de cozinha, espátulas, rolos de massa, panelas, caixas plásticas, espremedores, tábuas de corte, etc, para além de garantir que estão sempre bem lavados, devem ser escolhidos materiais que não sejam porosos e que não rachem ou risquem facilmente. Se isso acontece, podem permanecer partículas de glúten aprisionadas no próprio material e suas rugosidades e serem assim fonte de contaminação cruzada clinicamente significativa. É por isso preferível optar por materiais como o inox, o alumínio, a porcelana, a cerâmica vidrada ou o vidro, facilmente laváveis. A madeira, o barro, o bambu e o próprio plástico são materiais porosos a evitar. Os materiais ditos “antiaderentes”, caso estejam degradados ou riscados, podem também reter partículas de glúten apesar da lavagem habitual. Adicionalmente, numa cozinha “mista”, pode ser útil manter sempre à parte os utensílios dedicados à alimentação isenta de glúten, marcando-os e guardando-os separadamente e apenas para esse objectivo.

Em relação aos equipamentos (como, por exemplo, a torradeira, a tostadeira, a fritadeira, a máquina do pão, o forno ou o micro-ondas) o risco é, mais uma vez, da transferência de partículas alimentares contendo glúten. A regra será a da higienização eficaz do electrodoméstico que foi utilizado com glúten. Contudo, há equipamentos em que isso se torna desafiante, como no caso clássico da torradeira, que deve ser dedicada ao pão sem glúten uma vez que é difícil a sua limpeza em segurança. Da mesma maneira, as fritadeiras devem ser utilizadas apenas para alimentos sem glúten, pois os resíduos de frituras anteriores com glúten (presentes no material e no óleo) podem representar perigo para o celíaco. Deve-se também ter atenção à utilização do forno e micro-ondas, uma vez que a ventilação dos aparelhos pode fazer circular o glúten no seu interior. Resumindo, seja qual for o equipamento em questão, os princípios são os mesmos: limpeza completa e segura antes da utilização para o celíaco e, se tal for difícil ou pouco prático, será preferível dedicar o apetrecho aos alimentos sem glúten.

Outras regras simples, a aplicar em cozinhas não dedicadas apenas a alimentação isenta de glúten, são:

  • Armazenamento em local separado dos produtos isentos de glúten, sempre devidamente identificados;
  • Limpeza húmida das superfícies (como por exemplo chão, bancadas, prateleiras, mesas) e não a seco (varrer ou aspirar), para não levantar poeiras;
  • Utilização de panos e esponjas comuns, sem necessidade de separação ou de tratamento diferente, desde que sempre bem lavados;
  • Lavagem dos utensílios/loiças (preferencialmente de inox, alumínio, vidro, porcelana ou cerâmica vidrada) à mão (com detergente) ou na máquina, como habitualmente;
  • Utilização exclusiva de determinados equipamentos para a alimentação isenta de glúten (como por exemplo torradeira, tostadeira ou fritadeira);
  • Preparação, em primeiro lugar, das refeições sem glúten.

A doença celíaca (DC) é uma patologia que se pode manifestar em qualquer idade, com sintomas e sinais variados, alguns pouco evidentes e que obrigam a que se tenha um elevado grau de suspeição se quisermos chegar a esse diagnóstico. Os sintomas típicos, clássicos, essencialmente do foro intestinal – dor abdominal/cólicas, distensão, flatulência, diarreia e emagrecimento – surgem frequentemente em crianças e não passam habitualmente despercebidos quando há intervenção médica. Hoje em dia, com o aumento do conhecimento generalizado sobre a doença e com a melhoria dos métodos de diagnóstico, mais celíacos são diagnosticados em idades precoces, pediátricas. Isso torna-se fundamental, pois assim é possível minimizar o impacto da doença ao longo da vida desde que se obtenha um bom controlo através, claro, da dieta. A maioria das vezes em que o diagnóstico é feito na idade adulta, há um atraso até à sua confirmação porque as queixas são geralmente extraintestinais, e não indiciam imediatamente a suspeita de DC.

As pessoas doentes podem queixar-se de fadiga persistente, cefaleias, alterações do humor, mialgias, aftas na boca, perda de cabelo, dores articulares, ansiedade/depressão, osteoporose, problemas de pele ou da tiróide. Na criança pode constatar-se apenas atraso no crescimento (baixa estatura), atraso na puberdade ou dificuldades de aprendizagem. Há casos em que os únicos indícios poderão ser alterações laboratoriais como anemia por falta de ferro, deficiência de vitaminas ou alterações nas análises do fígado.

Por esse motivo, se uma pessoa tiver sintomas ligeiros ou inaparentes, podem ver passar vários anos até que seja diagnosticado: alguns estudos referem que, entre os primeiros sintomas, o ir ao médico e, finalmente, o ter o diagnóstico, o atraso médio é de 9 anos.

Depois de realizado o diagnóstico, especialmente na adolescência ou no adulto jovem, surgem outras dificuldades. São idades difíceis e especiais no que se refere à auto afirmação, irreverência e necessidade de integração em grupos, de amigos e na escola, podendo colocar em causa o único tratamento eficaz da DC: a dieta. Torna-se assim fundamental que, especialmente enquanto na sua alçada, os pais consigam transmitir às crianças a importância do rigor da dieta, ensiná-las a eficazmente lidar com ela e torná-las o melhor veículo de informação e de divulgação da DC no seu círculo de amigos e familiares. É igualmente importante que nessas idades jovens se crie e mantenha o hábito de um seguimento regular, médico e nutricional, de forma a garantir uma recuperação total do organismo e a remissão dos sinais e sintomas existentes. Porque são muitas vezes, como referido, queixas inespecíficas e ligeiras, essa avaliação pode ser mais difícil. Assim, os pais devem estar alerta para qualquer pista que possa ser importante e que pode passar por existir, além das queixas físicas evidentes, mau desempenho escolar, dificuldade de integração social, isolamento, ansiedade ou mesmo sinais de depressão.

As associações e grupos de celíacos, que filtram a informação aos jovens e oferecem formação cientificamente validada, facilitam em muito, aos pais e às crianças, a aprendizagem sobre todas estas vertentes da doença celíaca.

A doença celíaca (DC) tem, reconhecidamente, interferência com a saúde da mulher, na fertilidade, na gravidez e na amamentação e não são raros os casos de celíacas diagnosticadas no período peri-gravidez.

Sabe-se que a DC pode ser a causa de dificuldade em engravidar e o seu rastreio faz parte da investigação dos casos de infertilidade. Por outro lado, uma mulher com DC descompensada (ou activa) tem maior probabilidade de ter abortos espontâneos, bebés com baixo peso ao nascer e, até, maior probabilidade de morte fetal. O período de amamentação também parece ser encurtado se a DC não estiver bem controlada.

A DC pode mesmo ser diagnosticada durante a gravidez. Claro que não terá sido a gestação a “causa” da doença, mas essa gravidez terá tornado evidentes deficiências nutricionais ou fenómenos auto-imunes numa mulher até então aparentemente saudável. Mas como interfere a DC na gravidez? Essencialmente de 2 formas:

  • Por um lado, através das deficiências nutricionais que, se a DC não estiver controlada, podem-se tornar ainda mais manifestas. A gravidez representa uma fase de grande consumo e necessidade de nutrientes, quer para o metabolismo da mãe quer do bebé. Assim, as dificuldades de absorção, especificamente de vitaminas e minerais, nomeadamente vitaminas do grupo B, vitamina D, ferro, magnésio, zinco e cobre vão ter enorme impacto, claro, na saúde da mãe e no desenvolvimento do bebé.
  • Por outro lado, a DC através dos anticorpos que a caracterizam (nomeadamente o anticorpo anti-transglutaminase tissular) podem originar fenómenos auto-imunes na placenta e no útero, com consequente “inflamação” e assim condicionando também a evolução da gravidez.

Por estes motivos – e, claro, por muitos, muitos outros – a dieta isenta de glúten é fundamental e obrigatória numa mulher que pretende engravidar. É importante saber que uma celíaca compensada com uma dieta bem cumprida tem exactamente as mesmas probabilidades de complicações e de sucesso se quiser engravidar e ter filhos. Fará então parte dos planos para engravidar só o fazer quando tiver a DC controlada! Durante a gravidez a mulher celíaca está sujeita, como qualquer pessoa, à ingestão inadvertida de glúten. Essa contaminação pode ou não ser sintomática, isto é: não nos devemos fiar em determinados sintomas que conhecemos em nós para afirmar que fomos ou não contaminados. É muito perigoso pensar que “se for contaminado eu sei logo” ou que “eu sinto que como glúten”, porque a maioria dos casos de contaminação são totalmente assintomáticos. Na verdade, existem casos em que os celíacos ingerem inadvertidamente glúten e têm sintomas, mas isso só servirá para reforçar a ideia de que a dieta tem que ser rigorosa e sem descuidos.

E se uma contaminação inadvertida realmente acontecer, as tais análises aos anticorpos têm algum interesse para ter a certeza que existiu mesmo contaminação? É muito difícil ter certezas de contaminação, porque os anticorpos podem não aumentar obrigatoriamente ou podem fazê-lo apenas mais tarde. Por outro lado, não terá na grande maioria dos casos algum interesse clínico saber se os anticorpos aumentaram após suspeita de contaminação, porque isso não vai mudar em nada a atitude: dieta rigorosamente isenta de glúten. O que está feito não pode ser desfeito, mas há que prevenir que isso aconteça novamente.

Não esquecer que durante uma gravidez saudável, de uma mulher celíaca ou não-celíaca, é habitual existirem sintomas digestivos que podem confundir-se com sintomas celíacos. As celíacas podem senti-los e associarem-nos a actividade da doença, mas não estarem realmente relacionados. São exemplos a azia/ardor no estômago, o “refluxo”, o enfartamento, a sensação de digestão arrastada, a “pressão” abdominal, a obstipação, a diarreia, a flatulência ou as cólicas.

Em resumo, quando uma mulher pretende engravidar deve garantir que a DC está controlada para assegurar uma gravidez e período pós-parto saudáveis. Quaisquer queixas durante a gestação devem ser relatadas e avaliadas pelo médico assistente, sabendo-se que numa gravidez saudável podem existir sintomas digestivos banais mas que se podem confundir com a DC. A dieta deve ser rigorosamente isenta de glúten na pré-concepção, durante a gravidez, no pós-parto e, óbvio, ao longo do resto da sua vida!

Sim, é.

A maioria dos celíacos diagnosticados na idade adulta passou um período mais ou menos longo das suas vidas sem qualquer queixa. Tinham, portanto, uma doença assintomática (a tal doença “adormecida”), que, por não causar qualquer sintoma nem se apresentar com nenhum sinal, permaneceu totalmente despercebida. Embora não se saiba exactamente porquê, a certa altura, o indivíduo pode começar a ter queixas, quer do foro intestinal (cólicas, distensão ou diarreia, por exemplo), quer de outros órgãos (como as articulações, o sistema nervoso, a pele ou o sangue). Assim, uma doença celíaca assintomática e, por isso, nunca suspeitada, passa a manifestar-se e surge a oportunidade de se fazer a investigação correcta para se chegar ao diagnóstico final.

Respondendo à questão, na fase em que a DC é assintomática, é possível dela suspeitar caso se realizem as análises dos anticorpos específicos para esta doença. Se forem positivos, dever-se-á realizar endoscopia com biópsia do duodeno, que, se demonstrar atrofia, faz o diagnóstico.

Esta é, muitas vezes, a história da DC nos indivíduos sujeitos a rastreio, nomeadamente por terem um familiar de primeiro grau celíaco (pai, mãe, irmão ou filho): não têm queixas, sempre foram aparentemente saudáveis e apenas porque tal relação familiar aumenta o seu risco de ter DC em cerca de 20% propõem-se a fazer as análises. Porquê? Porque se forem mesmo celíacos, quanto mais cedo souberem e se começarem a tratar, melhor…

Como em qualquer outra doença, há uns celíacos que se apresentam com sintomas e sinais mais graves do que outros. Contudo, na DC não há uma “escala de gravidade” que se possa utilizar para classificar os celíacos. Algumas vezes utilizam-se os termos “DC controlada” ou “DC em remissão”, significando que não há sinais clínicos, laboratoriais nem microscópicos de DC. O inverso será uma “DC activa” ou “descompensada”, quando é possível constatar que a doença tem tido impacto negativo no organismo.

Assim sendo, não faz sentido questionar um celíaco sobre qual o seu “grau ou nível”. Contudo, percebe-se que essa falsa questão poderá relacionar-se com uma escala muito conhecida que se utiliza para classificar as alterações microscópicas da doença, quando se fazem biópsias do intestino delgado – a escala de Marsh. Contudo essa escala, que inclui 6 níveis (de 0 a 3c), serve apenas para isso mesmo: classificar a gravidade das alterações microscópicas observadas naquelas biópsias. Esta classificação não tem necessariamente correlação com a gravidade dos sintomas e, por isso, não serve para classificar clinicamente os celíacos.

Por isto, talvez a melhor resposta seja: “Grau? Nível? Não sei… Isso interessa? O que interessa mesmo é cumprir a dieta e ser um celíaco controlado!”

Após o diagnóstico inicial de Doença Celíaca (DC) e o início rigoroso de uma dieta isenta de glúten, cerca de 90% dos celíacos constatam um rápido alívio nos sintomas e, gradualmente, uma melhoria do seu estado nutricional e das alterações laboratoriais existentes. Se a dieta for mantida de forma disciplinada ao final de 1-2 anos será possível, na grande maioria dos casos, constatar a recuperação do intestino delgado, com o desaparecimento da atrofia das vilosidades e a retoma do seu aspecto normal.

Contudo, passados pelo menos 12 meses do início da dieta, num raro número de pessoas, não se verifica melhora dos sintomas e, adicionalmente, não se observa a recuperação intestinal: persistem a diarreia, a dor abdominal, o emagrecimento, o cansaço, o mal-estar geral, a anemia e as múltiplas deficiências nutricionais (vitaminas e minerais). Neste cenário, em que o celíaco mantém as queixas e se sente mesmo doente, investigadas e excluídas outras causas para o quadro clínico, pode colocar-se a hipótese de se tratar de uma DC refractária. Esta é uma situação pouco frequente (atinge menos de 1% dos celíacos diagnosticados) e surge essencialmente em indivíduos com mais de 50 anos, sendo considerada rara antes dos 30 anos. É importante reconhecer precocemente uma DC refractária porque pode associar-se a situações complexas como o linfoma intestinal.

Mas atenção! Há que distinguir uma verdadeira DC refractária – uma situação pouco frequente e grave – de uma DC persistente por estar mal controlada… Na verdade, a grande maioria dos celíacos que tem sintomas mantidos após 1 ano do diagnóstico e que, na repetição das biópsias, não vê melhorar ou normalizar as alterações microscópicas do intestino delgado têm, simplesmente, incumprimento dietético. Significa que, voluntariamente ou inadvertidamente (por contaminação), entra glúten no organismo, responsável por manter a actividade auto-imune que conduz à DC.

Torna-se assim fundamental manter o seguimento regular recomendado após o diagnóstico inicial da DC. Caso os sintomas persistam 6-12 meses depois de iniciada a dieta isenta de glúten, há que relatar isso ao médico e à dietista assistentes. Não esquecer que as falhas dietéticas são o principal motivo de não melhoria do celíaco! Excluída essa causa, é útil rever novamente todo o processo clínico, pois há outras doenças que podem imitar a DC e cujo diagnóstico diferencial pode ser difícil. O médico assistente, perante algumas dúvidas pode querer investigar um pouco mais e solicitar exames adicionais: pedir umas análises mais específicas, repetir a endoscopia com biópsias do duodeno, requisitar um exame de imagem do abdómen ou efectuar uma observação do intestino delgado por vídeo-cápsula, por exemplo.

Em resumo, a designação “Doença Celíaca Refractária” deve apenas ser utilizada para situações raras e concretas de celíacos que, com pelo menos 12 meses de dieta comprovadamente isenta de glúten, se mantêm doentes, com sintomas importantes e má-absorção intestinal. É importante salientar que a maioria das pessoas inicialmente classificadas como tendo uma “doença celíaca refractária” tem persistência das alterações intestinais apenas por incumprimento dietético…

A maioria poderá, mas a sua introdução na dieta deve ser cautelosa e controlada.

Porque o tema é controverso, o consumo de aveia pelos celíacos tem motivado algum debate ao longo do tempo. Salienta-se, desde já, que a aveia não é alimento obrigatório nem necessário ao celíaco e que o seu consumo é totalmente facultativo. Quem a quer consumir pretende aproveitar o seu conteúdo em fibra e o valor dos seus nutrientes. Claro que, quando aqui se refere “aveia”, tem que ser sempre e necessariamente aveia pura, certificada, isenta de glúten.

As proteínas consideradas tóxicas para os celíacos, genericamente chamadas “glúten”, são aquelas que estão presentes no trigo, cevada e centeio. São essas que, estimulando o sistema imunitário, conduzem à activação da auto-imunidade no celíaco e, assim, aos mecanismos que conduzem à doença e aos seus sinais e sintomas. Considera-se que a aveia, por ter na sua constituição proteínas diferentes dos restantes cereais, poderá não ser, quando comparada com os outros, tão tóxica para o celíaco.

A verdade é que existe uma pequena fracção de celíacos que reage negativamente à ingestão de aveia, levantando-se assim dois problemas adicionais: por um lado, não se consegue prever, entre todos, quais serão aqueles que poderão agravar a sua doença com esse cereal; por outro lado, há que garantir que o tal consumo de aveia não reactiva a doença, colocando assim em causa todo o esforço dedicado ao cumprimento adequado de uma dieta isenta de glúten.

Desta forma, a ingestão de aveia por um celíaco deve ser decididamente cautelosa e devidamente acompanhada pelo médico e nutricionista. Imediatamente após o diagnóstico inicial da doença, deve-se aprender a cumprir uma dieta rigorosa isenta de glúten e, nesta fase, a aveia deve também ser eliminada. O objectivo é aguardar pela recuperação do organismo, com o desaparecimento dos sintomas intestinais e, caso existam, dos sintomas relacionados com outras doenças associadas (da tiróide, da pele ou articulares, por exemplo). Progressivamente assiste-se a uma normalização das alterações laboratoriais, como as deficiências vitamínicas ou a anemia. É de esperar que, na grande maioria dos celíacos que tinham anticorpos específicos para a doença positivos (nomeadamente os anti-transglutaminase tecidular), estes se tornem negativos. É também expectável que o intestino delgado recupere da sua inflamação crónica e da atrofia das suas vilosidades. Esta reparação intestinal, especialmente no adulto e variando de caso para caso, deve ser comprovada com uma nova endoscopia com biópsias do duodeno.

Este processo de recuperação do organismo pode levar tempo (anos) e apenas se considera que o celíaco está controlado quando a dieta é cumprida, não tem sintomas e tem as análises de sangue e biópsias do duodeno normais. É nessa altura que se poderá considerar a hipótese de introduzir a aveia na alimentação caso, obviamente, seja esse o desejo do indivíduo. Isso deve ser feito com o devido acompanhamento médico/nutricional, pois há que ter alguns cuidados:

Ingerir diariamente, e durante um período de tempo pré-estabelecido, uma determinada quantidade de aveia certificada; Registar quaisquer sintomas ou sinais novos que possam surgir e relacionar-se com esse consumo; Realizar uma reavaliação médica após o tal período pré-estabelecido de “experiência”. Nesta altura é adequado repetir as análises e/ou a endoscopia com biópsias. O objectivo é garantir que, nesse indivíduo, o consumo de aveia não despertou a doença celíaca novamente. Em resumo, após o diagnóstico inicial de doença celíaca a aveia (tal como o trigo, centeio e cevada) deve ser eliminada da dieta. Deve-se aguardar a recuperação total do organismo e a confirmação médica de que a doença está controlada. Só então se pode introduzir a aveia na alimentação, caso se pretenda e sob vigilância clínica e de nutricionista. É depois obrigatória a confirmação de que o celíaco é tolerante à aveia e que esta não lhe é prejudicial.

Não!

O desenvolvimento do conhecimento científico sobre a doença celíaca (DC), nas últimas décadas, permitiu aos médicos conhecer melhor os mecanismos que levam ao seu aparecimento, identificar mais criteriosamente os sintomas (intestinais e extraintestinais) e ter à sua disposição testes diagnósticos sensíveis e específicos para ajudar no diagnóstico – anticorpos e estudos genéticos no sangue e análise microscópica das biópsias intestinais. Este progresso científico, a par de uma maior consciencialização da população geral, levou a um aumento do número de casos diagnosticados, reconhecendo-se que a aposta clínica deve ser feita no diagnóstico precoce, associado a menor taxa de complicações e de doenças concomitantes ao longo da vida.

Nos últimos 5 anos, temos todos sido testemunhas da importância do fenómeno “sem glúten” na indústria alimentar e no mercado. Para essa verdadeira explosão no consumo de produtos isentos de glúten, contribuem não só causas estritamente médicas (como a doença celíaca ou a intolerância ao glúten não-celíaca) mas essencialmente o facto de ser “uma moda”, “ser mais saudável” ou, simplesmente, ser “uma mania” de muitos. O negócio dos produtos sem glúten é, actualmente e em todo o mundo ocidental, um mercado muito apetecível pelo grande número de consumidores potenciais e pela sua rentabilidade económica. E isso não é necessariamente mau para o celíaco, aquele que verdadeiramente tem que cumprir uma dieta isenta de glúten: a DC ganha visibilidade e ergue a sua voz, há mais oferta nos restaurantes e supermercados, existe maior variedade de marcas e produtos e, porventura, a concorrência permite estabilizar os preços de venda ao público.

Apesar de toda esta dinâmica em torno da DC, no campo terapêutico, o único tratamento actualmente disponível é o cumprimento rigoroso de uma dieta isenta de glúten. A ínfima quantidade de glúten ingerida, propositada ou inadvertidamente, pode estimular o sistema imunitário e produzir efeitos nefastos sobre o organismo.

Em paralelo com a popularidade e o entusiasmo que actualmente observamos com as dietas isentas de glúten, têm aparecido no mercado produtos vários que se publicitam como uma ajuda no cumprimento da dieta, em especial na presença de alimentos declaradamente com glúten ou suspeitos de contaminação. Têm na sua composição enzimas digestivas (proteases) e/ou probióticos (micro-organismos que compõem e influenciam a flora intestinal)  e são promovidos comercialmente como substâncias que beneficiam os intolerantes ao glúten e os celíacos, facilitando o seu dia-a-dia. Estes produtos não devem ser consumidos, nem como substitutos da dieta isenta de glúten nem para tratar uma contaminação inadvertida. Não há qualquer recomendação médica para a sua utilização em qualquer circunstância.

Os celíacos devem estar atentos e munidos de toda a informação relevante para que possam facilmente rejeitar estas “propostas” que, previsivelmente, vão cada vez mais estar disponíveis no mercado.

  • Estes produtos não são medicamentos – são vendidos como suplementos alimentares em lojas físicas e on-line, com formas de apresentação doseadas semelhantes aos medicamentos (cápsulas, comprimidos, saquetas). Como por lei não podem mencionar propriedades profiláticas, de tratamento ou cura de doenças ou seus sintomas, recorrem muitas vezes nas suas publicidades a frases vagas e pouco explícitas, como “ajuda na digestão do glúten” ou “para utilizar se for comer glúten”. Outras vezes, são publicitados para “intolerantes ao glúten” sem menção directa à doença celíaca, podendo induzir em erro quem lê a sua rotulagem.
  • Não há nenhum destes produtos que tenha sido recomendado ou aprovado por nenhum grupo de estudos nem de especialistas em DC nem por nenhum organismo ou autoridade mundial reguladora de medicamentos. Pelo contrário, os especialistas têm-se mostrado muito preocupados com a proliferação destes compostos, que podem ser muito prejudiciais aos celíacos que as consumam e que nelas sintam alguma segurança (falsa) e assim reduzam o seu grau de alerta contra os alimentos com glúten.
  • Os probióticos têm sido extensamente estudados em várias situações clínicas, mas na DC não têm demonstração científica do seu benefício. Em laboratório há estudos que revelam diminuir a resposta inflamatória da parede intestinal, diminuir a permeabilidade intestinal, fortalecer a camada de muco protectora e produzir enzimas digestivas. Contudo, actualmente, não há evidência clínica de que os probióticos possam ser benéficos na DC e, por isso, não há recomendações para que um celíaco os tome (independentemente de qual probiótico, que mistura de bactérias e que doses). Adicionalmente, de forma preocupante, já foram encontrados vestígios de glúten em probióticos comercializados.
  • Os enzimas digestivos para a digestão do glúten (proteases) têm sido estudados em laboratório, não se tendo demonstrado qualquer benefício clínico na DC. A sua utilização é limitada por dois factores, até agora difíceis de contornar: têm que ser resistentes ao ácido gástrico e têm que inactivar todo o glúten ingerido antes que o bolo alimentar passe para o intestino delgado. É especialmente perigoso para a saúde de um celíaco que se pense que se trata uma contaminação ou uma ingestão voluntária de glúten com estes produtos.

Porque se anseia muito pela cura ou por um medicamento realmente eficaz na DC, logo que haja evidência científica que apoie uma qualquer nova terapêutica, seguramente as sociedades médicas não pouparão esforços para a sua aprovação, comercialização e divulgação. Essa informação não escapará ao radar de um celíaco. Até lá, reafirma-se que o único tratamento eficaz para a doença celíaca é a dieta isenta de glúten, rigorosa e mantida ao longo do tempo.

Não, não pode!

A dieta isenta de glúten (DIG) deve ser rigorosamente cumprida desde o momento do diagnóstico. O glúten tem a capacidade de estimular o sistema imunitário, o que se traduz primariamente na destruição das vilosidades intestinais e consequente má absorção de nutrientes, vitaminas e minerais. Embora quando se inicie a DIG o celíaco note melhoria rápida dos sintomas gastro-intestinais, é a manutenção dessa dieta que assegura a recuperação total do intestino e o desaparecimento dos sintomas relacionados com o glúten, para além de evitar o aparecimento de outras situações auto-imunes associadas à doença celíaca (tiroidite, artrite ou dermite, por exemplo). Quando um celíaco controlado (sem sintomas, sem alterações laboratoriais e com biópsias do duodeno já normais) começa a desleixar a sua dieta pode verificar que nada sente quando consome esporadicamente glúten. Na verdade, há celíacos muito sensíveis ao glúten e que, com uma quantidade mínima (mesmo como contaminante), têm sintomas variados que anunciam essa ingestão, reforçando assim a sua necessidade de ter uma DIG rigorosa. Contudo, o grupo dos celíacos que nada sente quando consome glúten torna-se o grupo mais “perigoso”: comem glúten voluntariamente ao longo do tempo e continuam a sentir-se bem e porventura, esquecem o acompanhamento médico e nutricional… Mas o seu sistema imunitário está activado de forma silenciosa, mantendo algum grau de destruição intestinal e aumentando o risco, ao longo do tempo, de complicações associadas à doença celíaca. Estes celíacos pouco exigentes na sua dieta, apesar de se sentirem bem e terem análises normais, têm biópsias do duodeno que confirmam que existe lesão das vilosidades intestinais. Assim, para evitar uma progressão silenciosa da doença celíaca é necessário manter permanentemente uma DIG, sabendo que uma quantidade mínima de glúten pode ser prejudicial. Relembra-se que a dieta isenta de glúten tem duas vertentes: ou se cumpre ou não se cumpre. Não há meio termo…

É possível, sim.

Quando um celíaco é diagnosticado recomenda-se o rastreio, em análises de sangue, de algumas deficiências nutricionais, comuns nestas situações. É frequente encontrar níveis baixos de ferro, ácido fólico (vitamina B9), vitamina B12, vitamina D, zinco e magnésio. Podem ainda ser aparentes outras deficiências que, regra geral, se relacionam com a gravidade sintomática da doença: proteínas, lípidos, hidratos de carbono, outras vitaminas (A, E, K ou do complexo B, por exemplo) e de outros minerais (cálcio ou fósforo, nomeadamente). Qualquer uma destas deficiências detectadas no sangue pode traduzir-se em variados sintomas ou sinais no celíaco. Por exemplo, as deficiências de ferro ou de ácido fólico podem originar anemia, a de vitamina D pode favorecer a osteoporose, a de vitamina B12 pode ser causa de sintomas neurológicos variados bem como de anemia e a de zinco retardar o crescimento e desenvolvimento na criança.

O início da DIG permite a recuperação gradual do intestino delgado, o restaurar da capacidade de absorção e da normalização das deficiências aquando da data de diagnóstico. Contudo, esta normalização pode ser lenta e depende de vários factores: do estado de gravidade inicial da doença, do rigoroso cumprimento da dieta (há sempre um período de aprendizagem) e do aporte na dieta dos nutrientes em falta. Na verdade, na maioria dos casos, 1 ano depois de iniciada a restrição de glúten é de esperar essa normalização. Quando isso não se verifica, em primeiro lugar, há que manter a suspeita de que a DIG não está a ser cumprida, quer voluntariamente quer porque existe contaminação. O celíaco deve recorrer a um Nutricionista com experiência na DC e deve ser feita uma revisão sistemática do diário nutricional, garantindo a restrição de glúten.

Mas, apesar do cumprimento da dieta e mesmo demonstrando-se a total recuperação intestinal (repetindo a endoscopia alta com biopsias do duodeno) podem persistir algumas deficiências nutricionais. Nesse caso, há que assegurar que a DIG é equilibrada e que não é uma dieta pobre em determinadas vitaminas ou minerais. Por outro lado, um organismo ainda em recuperação pode exigir uma quantidade diária de determinados nutrientes superior ao habitual. Assim sendo, o Médico pode considerar adequada a suplementação oral que é feita, geralmente, sob a forma de comprimidos ou cápsulas.

Não! Não se deixa de ser celíaco…

A doença celíaca (DC) é uma situação auto-imune que não se espera que resolva com o passar do tempo, com a idade ou com fases da vida, como a adolescência ou a menopausa. O diagnóstico de um celíaco tem que ser feito com rigor. Para isso, recolhem-se informações acerca de eventuais sintomas e sinais, a análises do sangue (nomeadamente aos anticorpos específicos da doença e à genética) e aos resultados da endoscopia com biópsias do duodeno (mostrando atrofia). Caso seja tudo compatível, pode-se afirmar a DC com um elevado grau de certeza: a dieta isenta de glúten deve ser imediatamente instituída e mantida para o resto da vida. Só essa dieta rigorosa e mantida poderá evitar o reaparecimento das queixas associadas à DC, impedir a instalação de outras doenças auto-imunes e evitar complicações irreversíveis.

Existem casos de pessoas que asseguram que “deixaram de ser celíacas”… na verdade esses indivíduos nunca terão sido celíacos e o diagnóstico terá sido feito sem grande suporte científico ou com base em exames pouco fiáveis ou com resultados incompletos. Contudo, ao iniciar uma dieta isenta de glúten, sentiram-se bem melhor – por coincidência ou porque têm alguma hipersensibilidade ao glúten não celíaca – e, por isso, foram classificados como “celíacos”. Mais tarde, terão voltado a ingerir de glúten sem aparente problema e, ao repetir os exames médicos… não há sinais de DC! Mas não deixaram se ser celíacos: a verdadeira questão é que nunca o foram.

Até que a ciência evolua para novas abordagens, um celíaco diagnosticado sê-lo-á para o resto da vida e deve cumprir sempre uma dieta rigorosa. Contudo, há boas perspectivas. Estão em curso investigações na área da imunologia no sentido de permitir ao sistema imunitário do celíaco “aprender” a tolerar glúten, não reagindo de forma a destruir as células do intestino delgado. Até lá, dieta isenta de glúten!

Sim, é verdade.

Podem-se passar anos até que o diagnóstico seja feito, já na idade adulta. Isto é especialmente verdade nos casos em que as queixas são mínimas, ligeiras ou inaparentes. São exemplos as pessoas com anemia por carência de ferro ou de ácido fólico, os indivíduos apenas com flatulência e cólicas abdominais ou aqueles com cansaço ou fadiga crónica e inexplicável. São geralmente sintomas que toleram ao longo do tempo e com os quais vão vivendo. Alguns estudos referem que, entre os primeiros sintomas, o consultar o médico e, finalmente, o ter o diagnóstico, o atraso médio é de 9 anos!

Assim, um diagnóstico tardio, no qual o sistema imunitário esteve “activado” durante um período longo, associa-se a maior probabilidade de situações irreversíveis concomitantes (como a osteoporose), de aparecimento outras doenças auto-imunes (como a tiroidite) e, eventualmente, de uma frequência aumentada de alguns tumores (do intestino delgado, por exemplo). Por esses motivos, na presença de suspeita clínica ou de pessoas assintomáticas com indicação para rastreio da DC (por exemplo, nos familiares de primeiro grau de celíacos) deve ser planeada uma estratégia de diagnóstico que se revele eficaz e rápida.

A doença celíaca nem sempre é fácil de diagnosticar. Nos casos em que tudo encaixa bem e o puzzle se compõe, o diagnóstico pode ser muito linear: alguém que tem queixas típicas (diarreia, dor e distensão abdominal e emagrecimento), com análises sugestivas (sinais laboratoriais de má absorção), serologia positiva (nomeadamente anticorpos anti-transglutaminase IgA elevados) e biópsias duodenais mostrando atrofia. Contudo, são cada vez mais frequentes os casos de adultos que se queixam, sem dúvida, de sintomas relacionados com a ingestão de glúten e que recorrem a uma consulta médica para investigação e que, após investigação completa, não é possível estabelecer o diagnóstico de doença celíaca. São pessoas geralmente com predisposição genética (genes positivos), sem alterações nas análises sanguíneas e com anticorpos negativos. As suas biópsias duodenais não são conclusivas porque não mostram inequivocamente atrofia (que é necessária para o diagnóstico de um celíaco) mas também não são totalmente normais (por terem linfócitos entre as células intestinais)… Como estes indivíduos se queixam repetidamente de sintomas quando ingerem glúten, acabam por fazer uma dieta dele isenta pois é assim que se sentem melhor. Podemos especular que pessoas com estas características têm “hipersensibilidade ao glúten não celíaca” – uma nova doença, ainda pouco estudada, sem critérios diagnósticos definidos mas também relacionada com os cereais (com o glúten ou com outras proteínas dos cereais, ainda não caracterizadas). Até que o conhecimento científico nos revele mais, estes indivíduos – com sintomas relacionados com o glúten mas sem diagnóstico de doença celíaca – devem cumprir a dieta com a qual se sentem melhor, mantendo ainda uma vigilância médica regular.

Atenção…

A doença celíaca, sendo uma doença que causa má absorção intestinal, pode cursar com deficiências nutricionais. Faz parte da investigação inicial – no momento do diagnóstico – e da rotina – ao longo do tempo – o pedido de um conjunto de análises de sangue que se destinam a investigar se há alguma deficiência que deva ser suplementada. Assim, alguns celíacos orientados pelo seu médico e após realizar alguns exames beneficiarão realmente de suplementos vitamínicos e minerais (como, por exemplo, cálcio, ferro, vitamina B12 ou ácido fólico). Esses suplementos deverão ser prescritos na consulta e ser especificamente livres de glúten. Não esquecer que nunca deverão ser utilizados como substituição de uma dieta saudável, equilibrada e adequada.

Os produtos à base de proteínas (batidos), actualmente tão aconselhados na prática do exercício físico, têm que ser utilizados com cuidado e, a primeira questão a colocar é acerca da sua real vantagem para o tipo de treino e face ao objectivo que se tem com essa prática. Seguidamente, há que considerar que os produtos a consumir: a) têm de estar especificamente rotulados como livres de glúten; b) têm geralmente substâncias acrescentadas para dar paladar, como edulcorantes ou açúcares artificiais (nomeadamente sorbitol ou aspartame) que, por si só, são causadores de alguns sintomas gastrointestinais; c) podem ter na sua composição outros componentes porventura lesivos ou tóxicos para outros órgãos como o fígado ou o rim. Não esquecer que é possível, no contexto da prática desportiva e de ginásio, cumprir uma dieta reforçada em proteínas utilizando alimentos comuns… E que há, como exemplo, receitas variadas para desportistas, como por exemplo barras energéticas (com reforço de carbo-hidratos e proteínas) que se podem fazer em casa com toda a segurança com alimentos naturalmente isentos de glúten.

Ainda não…

A doença celíaca (DC) trata-se cumprindo uma dieta totalmente isenta de glúten. No entanto, existem algumas linhas de investigação envolvendo terapêuticas variadas, nomeadamente uma vacina. Note-se que, em rigor, o termo «vacina» deve apenas ser aplicado aos tratamentos preventivos de doenças infecciosas, mas a sua utilização tem sido vulgarizada quando se discute a DC.

Quando um celíaco ingere glúten (o agente agressor), os seus linfócitos (células imunitárias) reagem de forma determinada, tendo em vista a sua neutralização. A resposta imunitária e de defesa contra o glúten torna-se desregulada e desproporcionada, com reações autoimunes conduzindo à progressiva destruição das células do intestino delgado e de outros órgãos também envolvidos na DC. Com a persistência do consumo de glúten, mantém-se o ciclo da inflamação e observa-se o desaparecimento gradual das vilosidades, má absorção dos alimentos ingeridos e, ao mesmo tempo, aparecimento dos sinais e sintomas conhecidos da doença.

A vacina, tal como está em desenvolvimento, pretende ensinar ao sistema imunitário uma forma de tolerar o glúten ingerido e, assim, evitar as reações que conduzem à destruição da parede intestinal e de outros órgãos envolvidos na DC. A estratégia atualmente em desenvolvimento assemelha-se àquela utilizada nas doenças alérgicas, como nas alergias aos ácaros, aos pólenes ou aos pêlos de gato (que podem causar rinite, sinusite ou asma, por exemplo). Pretende-se «dessensibilizar» (passagem de um indivíduo sensível a determinado produto a «insensível»), estimulando progressivamente o sistema imunitário com doses crescentes desses agentes agressores. Assim, naturalmente e ao longo do tempo, o organismo aprende a suportá-los, tornando-se-lhes tolerante.

Os estudos para a vacina da DC têm sido efetuados em celíacos DQ2 positivos (o gene mais frequente). Foram injetados de forma subcutânea (debaixo da pele, como a insulina dos diabéticos) um composto de três proteínas constituintes do glúten e que se consideram ser os principais agressores e desencadeantes da resposta das células imunitárias. A investigação terminou, já este ano, a fase em que se estudaram, com administração de doses variadas, a segurança, a tolerância e o mecanismo de ação do produto. Após aplicar a injeção a um número relativamente pequeno de pessoas, colheram-se amostras de sangue e de outros fluídos para análises e estudaram-se os efeitos no organismo. Como os resultados foram animadores, a fase seguinte, programada ainda para 2017, determinará se este produto tem realmente eficácia clínica, quais os efeitos secundários e a sua atividade biológica. Este passo vai ser crucial para concluir se poderá ser mesmo útil aos celíacos.

Pensa-se que o maior interesse dessa vacina seja ajudar a recuperação dos celíacos sob dieta e, numa perspetiva mais avançada, permitir aos celíacos a opção em segurança por uma dieta com glúten. O tratamento, embora ainda não definido, terá uma primeira fase (chamada fase de indução) na qual as injeções serão mais frequentes, de doses mais pequenas e monitorizadas pelo médico. Posteriormente, na fase de manutenção, será possível utilizar doses maiores, espaçar as injeções e até permitir que seja o celíaco a fazê-las, em casa.

Sabemos que as etapas de investigação de um fármaco têm múltiplos obstáculos a ultrapassar e que apenas uma percentagem pequena dos medicamentos em estudo acaba por ser comercializada. Contudo, os desenvolvimentos científicos nos últimos tempos devem trazer ânimo e são razões válidas para manter alta a expectativa. Até lá (e nunca antes de cinco anos…), cumprir uma dieta isenta de glúten é o melhor – e único – conselho!

Muitos celíacos contam que o mais difícil foi mesmo chegar até ao diagnóstico. A partir dessa altura, a manutenção de uma dieta isenta de glúten permitirá a recuperação intestinal, a remissão das queixas e a restituição da sua qualidade de vida. Uma vez diagnosticada a DC, torna-se importante:

  • Aprender sobre a DC, recorrendo sempre a fontes de informação cientificamente fiáveis. Cada celíaco deve estar capacitado para ser o melhor veículo de informação e de divulgação no seu círculo de amigos e familiares.
  • Controlar a sua dieta com segurança. Para isso há que aprender a escolher os alimentos (conhecer os proibidos, os perigosos e os permitidos) e a interpretar correctamente os rótulos das embalagens, extraindo daí a informação vital. A manipulação dos alimentos e o cozinhar sem glúten não deverão representar problemas e, para o facilitar, existem truques e dicas ensinados em encontros e workshops organizados para o efeito.
  • Manter a sua vida e rotinas habituais, adaptando-as a um estilo de vida gluten free. Não é de esperar qualquer constrangimento ou limitação no plano familiar, social, académico ou profissional: deve continuar a comer fora, a divertir-se com os seus amigos, a frequentar as casas de familiares e a viajar. Existem certamente «momentos difíceis» no cumprimento da dieta isenta de glúten, de provação ou de tentação, que se aprendem a gerir eficazmente. A passagem do tempo e a experiência individual seguramente vão ajudar.
  • Aderir à vigilância médica e ao acompanhamento dietético com a periodicidade que lhe for recomendada, de acordo com o seu caso específico. Alguns celíacos precisarão, nos primeiros tempos, de apoio médico mais intensivo e regular, devido à sua idade, ao maior impacto da DC no organismo ou à presença de doenças associadas.

Muito frequentemente ouvimos indivíduos a relatar queixas de distensão (ou inchaço) abdominal, de sensação de gases, de flatulência e de cólicas abdominais, por vezes acompanhadas de gorgolejo (ruídos no abdómen). Essas pessoas podem não ter qualquer alteração do trânsito intestinal ou, então, até contarem ter diarreia ou obstipação. Alguns desses indivíduos já perceberam que uma dieta isenta ou «com menos» glúten os faz sentir melhor. Claro que, quando a conversa é tida com um celíaco (ou com um médico…), percebe-se onde se quer chegar: “será que também sou celíaco?” Vejamos:

  • Todos os sintomas referidos acima são inespecíficos da DC e muito frequentes na prática clínica. Não são sintomas que, isoladamente, façam imediatamente apontar para a DC e, na verdade, a maior probabilidade é de se tratar de uma outra doença que se pode manifestar desta forma, tal como a síndrome do cólon irritável ou a intolerância à lactose.
  • Não é apenas por se verificar uma relação entre ingerir menos glúten e ficar melhor que se faz o diagnóstico de DC. Ao diminuir o volume de glúten ingerido, reduz-se frequentemente a carga de fibra da dieta (entre outros componentes) e isso, por si só, poderá ter um impacto positivo nas queixas apresentadas. Embora isto isoladamente não permita fazer o diagnóstico de DC, o seu médico assistente terá todo o interesse em saber dessa associação.
  • Não deve ser iniciada uma dieta isenta de glúten antes de se consultar um médico e de fazer o estudo adequado. O cumprimento de tal dieta por um indivíduo não celíaco nunca representa, por si só, um risco para a sua saúde desde que esta seja equilibrada e racional, como qualquer outra opção nutricional o deve ser. Contudo, é importante salientar que algumas semanas de dieta isenta glúten poderão comprometer os resultados dos exames complementares e assim adiar-se ou perder-se a oportunidade de um diagnóstico preciso da situação.

Assim sendo, os indivíduos que têm queixas e cuja experiência alimentar os coloca na dúvida de serem ou não celíacos devem ser encaminhados para o seu médico e não devem iniciar dieta isenta de glúten antes de ser feito o estudo clínico adequado. Só assim se poderá chegar ao diagnóstico acertado.

Depois de feito o diagnóstico de doença celíaca, a dieta isenta de glúten deve ser mantida de forma rigorosa e durante a vida toda (ou até que novas descobertas científicas alterem este conselho!). Além disso, o celíaco deve aderir a um plano de vigilância regular, tal como em qualquer outra doença crónica, como a asma, hipertensão arterial ou diabetes.

Ao longo do tempo, o seu médico vai perceber, conversando e observando-o na consulta, que a doença está controlada e que não há sintomas nem sinais de nenhuma complicação. Deve realizar, rotineiramente, algumas análises de sangue para confirmar, entre outros, se existe alguma anemia, deficiência vitamínica ou de oligo-elementos (como ferro, ácido fólico, vitaminas B12 e D, cálcio) ou alterações do fígado, da tiróide ou das proteínas. Na maioria dos celíacos, é também útil dosear no sangue os anticorpos específicos da DC (como o anti-transglutaminase tissular IgA). O seu médico pode sugerir repetir a endoscopia com biópsia do duodeno, para confirmar a boa recuperação das vilosidades intestinais, atrofiadas pela inflamação causada pela ingestão de glúten. Esta endoscopia de controlo é pedida, geralmente, não antes de 1-2 anos de dieta bem cumprida, pois o regresso à normalidade do intestino delgado pode ser lento. Existem mais exames complementares que podem ser úteis no contexto de uma DC, mas terão de ser ajustados ao caso concreto de um indivíduo.

Além da consulta médica de rotina, não se deve esquecer o regular acompanhamento por um nutricionista com experiência no tema. Só assim pode assegurar que a sua dieta está, além de efectivamente restrita de glúten e livre de contaminações, equilibrada no que respeita a calorias e aos múltiplos nutrientes necessários a uma alimentação saudável.

Não, não pode!

A dermite herpetiforme (DH) é uma outra doença de intolerância ao glúten, cujas manifestações surgem na pele. É uma doença autoimune que pode surgir associada ou não à doença celíaca. É, portanto, uma doença com a mesma «origem», mas diferente da doença celíaca.

Habitualmente nota-se que a pele fica ligeiramente mais vermelha do que o habitual e com umas vesículas (bolhas) muito pequenas, que dão muita comichão e que rebentam facilmente ao coçar, libertando um líquido que lá têm dentro – por parecerem herpes (doença causada por um vírus), dá-se-lhe o nome de «herpetiforme». Estas alterações aparecem de forma simétrica (num lado e noutro do corpo), especialmente nos cotovelos, joelhos, costas, ombros, nádegas, nuca e couro cabeludo. Quando os dermatologistas observam estas alterações, podem optar por fazer uma biópsia das lesões, que geralmente confirma o diagnóstico. Como é uma doença de pele causada pela ingestão de glúten, o tratamento de longo prazo consiste na dieta isenta de tal substância.

Quando se faz o diagnóstico de DH é obrigatório investigar a presença simultânea de doença celíaca, mesmo que não exista qualquer queixa intestinal — cerca de 80% dos indivíduos com essa dermite são, em simultâneo, celíacos! É fundamental que essa investigação seja feita antes de excluir o glúten da dieta, para que os resultados não sejam falseados.

Como a DH é uma doença crónica, e apesar de existirem alguns medicamentos que se podem utilizar para a controlar (ex.: dapsona), o tratamento a longo prazo implica a isenção rigorosa de glúten da dieta. Só assim se reduzem as recidivas da dermatite e a necessidade de medicação e se controla a doença celíaca, se esta estiver simultaneamente presente. Cumprir a dieta com rigor pode ainda reduzir o risco de aparecimento de outras doenças autoimunes.

Em conclusão, embora a DH não seja sinónimo de doença celíaca (há cerca de 20% de pessoas com dermite que não são celíacas), o tratamento de longo prazo é a dieta sem glúten!

Não. Tolerância ZERO. A quantidade mínima que pode comer é… nenhuma!

Depois do diagnóstico da doença celíaca, a dieta isenta de glúten deve ser rigorosamente mantida ao longo do tempo. Sabe-se que uma ínfima porção de glúten pode ser suficiente para despertar a reação do sistema imunitário, originando uma cascata de acontecimentos que leva à destruição das vilosidades e ao aparecimento de sintomas digestivos e noutros órgãos. Esta estimulação imunitária, na maioria dos celíacos, não causa sintomas de imediato, podendo demorar dias ou semanas até se manifestar, por vezes de forma intensa – na verdade, não é como uma reação alérgica imediata a uma picada de abelha (inchaço da face, comichão e vermelhidão no corpo e dificuldade em respirar, por exemplo) nem como uma alergia alimentar em que alimentos (amendoins, morangos, marisco…) causam sintomas rapidamente depois de serem ingeridos. Porque a ingestão ocasional de glúten habitualmente não causa sintomas (mas ativa o sistema imunitário) e porque esses sintomas podem só aparecer mais tarde, alguns celíacos sentem-se tentados a quebrar as suas regras dietéticas, ingerindo voluntariamente glúten ou reduzindo a atenção e o alerta perante alimentos suspeitos. Mas isso é totalmente errado e perigoso, pois qualquer mínima quantidade de glúten pode ser prejudicial.

Nunca pensar que se controla a dieta isenta de glúten com base na ideia de que “posso comer glúten pois não me dá queixas” ou de que “se ingerir glúten, eu sinto”! Um celíaco não pode mesmo ingerir glúten, nem basear-se em quaisquer sintomas para ir controlando a sua dieta: tolerância zero!

Não necessariamente, mas…

Desde o momento do diagnóstico é fundamental que se cumpra rigorosamente a dieta isenta de glúten. Só assim se poderá assegurar a total recuperação intestinal e esperar uma vida sem as complicações de uma doença de longo curso.

Contudo, há doenças vulgares do foro digestivo que se manifestam com sintomas semelhantes aos da doença celíaca. Na verdade, se um celíaco tem esses sintomas (como as cólicas, a flatulência e alterações ocasionais do trânsito intestinal), isso não significa obrigatoriamente que a sua doença está descompensada. Podem apenas ser queixas associadas, por exemplo, aosíndroma do intestino irritável ou a uma intolerância à lactose, patologias muito frequentes na população geral e, por isso, igualmente frequentes no celíaco.

Mas, na verdade, esses mesmos sintomas podem denunciar algum incumprimento dietético… Podem ser as primeiras queixas a denunciar uma ingestão voluntária ou involuntária (contaminação) de glúten. Assim, se um celíaco até agora sem sintomas (isto é, com a doença controlada) começar a sentir novas queixas, é importante que seja feita uma revisão da sua situação clínica.

Essa revisão, realizada pelo seu médico e dietista assistentes, deve perceber, através da história clínica, observação e eventualmente recorrendo a alguns exames complementares de diagnóstico, se as queixas realmente são “celíacas” ou se estão relacionadas com outra qualquer doença gastrointestinal, que interessa diagnosticar para poder tratar.

É ainda um tema controverso, mas admite-se que seja seguro o consumo de aveia na maioria dos celíacos… Mas garantindo obrigatoriamente algumas condições!

Chama-se genericamente «glúten» às proteínas das sementes dos cereais insolúveis em água. Essas proteínas são essencialmente de dois tipos: prolaminas e gluteninas. As prolaminas das sementes de trigo, cevada e centeio, quando ingeridas, são tóxicas para os celíacos. Na verdade, as prolaminas dos vários cereais são diferentes, na sua constituição – pode dizer-se que o glúten do trigo é diferente do glúten da cevada ou do centeio. Contudo, sabemos que qualquer um desses três «glútens» é muito prejudicial a um celíaco.

A aveia tem também o seu tipo especial de glúten, diferente do dos outros cereais. Comparando com o trigo, centeio e cevada, na aveia, a quantidade de glúten é menor e tem uma composição química diferente, que se considera menos tóxica ou mesmo segura para o celíaco.

Embora este tema seja ainda debatido, a evidência científica atual admite que, para a maioria dos celíacos, seja seguro consumir aveia. De qualquer forma, esse consumo só deve ser feito de acordo com a opinião e supervisão do médico e dietista assistentes: uma percentagem pequena dos celíacos reage imunologicamente à aveia, que neles é tão prejudicial quanto os cereais tóxicos habituais.

Assim, a estratégia para um celíaco que não consome e que admite agora vir a consumir aveia passa pelos três tópicos seguintes:

  • Pergunta: Quer mesmo ingerir aveia? Na verdade, não é, culturalmente, um cereal que se consuma com frequência entre nós. Mas sabemos que a aveia tem um bom valor nutricional e que o seu consumo aumenta significativamente o aporte de fibra, tão necessário por vezes para controlar o trânsito intestinal. Insiste nisso? Será necessário?
  • Informação: Caso a resposta seja «Sim, quero!», torna-se fundamental saber e relembrar que só poderá utilizar aveia certificada, ou seja, comprovadamente livre de qualquer contaminação por outros cereais tóxicos (durante o cultivo ou processamento industrial). Reforça-se que a certificação gluten-free na aveia significa assegurar que não tem contaminação de glúten do trigo, cevada ou centeio – na verdade, tem o tal glúten da aveia, potencialmente não tóxico para o celíaco.
  • Decisão: Caso pretenda introduzir a aveia na sua dieta regular, tem de fazê-lo sob supervisão do seu dietista e médico assistente. Genericamente, é necessário:
    • Assegurar inicialmente a remissão da doença celíaca (para ter a certeza de que está tudo controlado, antes de introduzir a aveia);
    • Ingerir diariamente, e durante um período de tempo pré-estabelecido, uma determinada quantidade de aveia certificada;
    • Anotar quaisquer sintomas ou sinais novos que possam surgir e relacionar-se com esse consumo, sabendo que algumas queixas gastrointestinais podem apenas ter relação com o aumento da fibra na dieta;
    • Reavaliar obrigatoriamente a estabilidade da doença celíaca depois do período estipulado de consumo de aveia: caso haja sinais de que voltou a existir inflamação no intestino delgado, não deverá mais consumir aveia… Quer esta avaliação final, quer a inicial serão feitas conforme as indicações do seu médico assistente, variando de acordo com o indivíduo e as características da sua doença – são para isso utilizadas análises sanguíneas e endoscopia com biópsia duodenal.

Em conclusão, se for um celíaco com a doença controlada, cumpridor da sua dieta e caso queira mesmo consumir aveia certificada, poderá experimentar fazê-lo sob supervisão médica. Se então se comprovar que a aveia é inócua para si, poderá consumi-la sem problema.

A DC é uma doença que apenas surge em indivíduos geneticamente susceptíveis, ou seja, que são positivos para os genes que lhe estão associados: DQ2 ou DQ8. Isto significa que, se o gene existe na família, existe uma maior probabilidade de surgirem familiares celíacos. Calcula-se que a probabilidade de um familiar de primeiro grau de um celíaco (pai, mãe, irmãos ou filhos) ter também doença celíaca é de cerca de 10%.

Para estes 10 % de probabilidade de um celíaco ter um filho também intolerante ao glúten, não contam unicamente a existência dos genes DQ2 ou DQ8, embora saibamos que a sua presença é obrigatória para que se seja celíaco. Existem outros fatores que se relacionam com o aparecimento da DC, nomeadamente alguns ligados ao ambiente, à exposição do indivíduo a infeções virais, à flora intestinal, à amamentação enquanto criança e à idade de introdução do glúten na dieta.

Assim sendo, sendo celíaca, o pediatra dos seus filhos deverá desde logo sabê-lo. Só assim poderá aconselhá-la corretamente ao longo do tempo.

No momento do diagnóstico de DC os anticorpos transglutaminase tissular IgA (TTG-IgA) são positivos em cerca de 90% dos casos. Quando se inicia a dieta isenta de glúten, a maioria desses celíacos normaliza os valores dos anticorpos. Quando, ao longo da vida, se observa novamente a sua subida (ou seja, voltam a estar positivos) isso significa quase sempre que a dieta não está a ser cumprida…

Vale então a pena recorrer ao seu médico assistente e consultar a dietista que o acompanha, para rever o caso clínico em pormenor e aferir o rigor da sua dieta.

Por esse motivo, não.

A doença celíaca é uma patologia autoimune desencadeada pela ingestão de glúten: é sempre necessário que o indivíduo coma alimentos que contenham glúten para que a doença se manifeste.

Existem situações de «reação» da pele após aplicação de produtos cosméticos derivados do trigo, bem como após utilização de tintas de cabelo ou mesmo depois de mexer com as mãos em produtos/alimentos com glúten. Essas manifestações poderão, eventualmente, estar associadas a uma alergia a um dos seus variados componentes, mas isso não equivale a dizer que se é celíaco!

Depende…

A anemia por falta de ferro (chamada anemia ferropénica) é das manifestações mais frequentes da DC, podendo mesmo ser o sinal laboratorial único, numa pessoa sem sintomas, motivando a investigação adequada e consequente diagnóstico. A causa mais frequente de deficiência de ferro no celíaco recém-diagnosticado é a má absorção intestinal por inflamação da parede intestinal. Quer isto dizer que, mesmo que o indivíduo ingira ferro em quantidade suficiente na sua alimentação, enquanto as vilosidades não começarem a recuperar e a absorver adequadamente os nutrientes, a anemia manter-se-à. Só quando o intestino tiver a  sua capacidade de absorção recuperada é que os depósitos de ferro do organismo voltarão ao normal e a anemia desaparecerá. Esta recuperação total ocorre a um ritmo variável – diferente em cada pessoa – mas, na maioria dos casos, demora até um ano, podendo ser útil o reforço do ferro na dieta ou, até, a administração na forma endovenosa.

Caso a recuperação não se processe de forma expectável e se entenda que isso é  adequado clinicamente, devem ser pesquisados outros fatores  que dificultem uma boa evolução. São  disso exemplos a existência de efeitos secundários aos comprimidos de ferro (que impeçam a sua toma nas doses correctas), a prescrição  simultânea de alguns medicamentos que dificultam a absorção do ferro, as hemorragias ginecológicas concomitantes e a perda de sangue do tubo digestivo, de forma visível ou oculta (por exemplo, por úlcera, pólipo, tumor,  doença inflamatória ou hemorróidas). Podem ainda existir outras doenças simultâneas à DC, com inflamação generalizada no organismo e, por isso, chamando o consumo do ferro para si.

Contudo, na primeira linha do pensamento, como hipótese mais provável para uma recuperação mais lenta do que esperado de uma anemia ferropénica, está sempre a suspeita de ingestão de glúten… O não cumprimento dietético, propositado ou involuntário (contaminação), é a principal causa da lenta ou da não recuperação da anemia (e, na verdade, das restantes queixas e alterações laboratoriais) de um celíaco. Assim, é útil que nessas circunstâncias médico e dietista assistentes revejam novamente o caso garantindo o bom cumprimento da dieta.

Sim, é.

A maioria dos celíacos diagnosticados na idade adulta passou um período mais ou menos longo da sua vida sem qualquer queixa. Tinha, portanto, uma doença assintomática (a tal doença «adormecida») que, por não causar qualquer sintoma nem se apresentar com nenhum sinal, permaneceu totalmente despercebida. Embora não se saiba exatamente porquê, a certa altura, o indivíduo pode começar a ter queixas, quer do foro intestinal (cólicas, distensão ou diarreia, por exemplo) quer de outros órgãos (como as articulações, o sistema nervoso, a pele ou o sangue). Assim, uma doença celíaca (DC) assintomática e, por isso, nunca suspeitada, passa a manifestar-se e surge a oportunidade de se fazer  a investigação correta para se chegar ao diagnóstico final.

Respondendo à  questão, na fase em que a DC é assintomática, é possível dela suspeitar caso se realizem as análises dos anticorpos específicos para esta doença. Se forem positivos, dever-se-à realizar endoscopia com biópsia do duodeno que, se demonstrar atrofia, faz o diagnóstico.

Esta  é, muitas vezes, a história da DC nos indivíduos sujeitos a rastreio, nomeadamente por terem um familiar de primeiro grau celíaco  (pai, mãe, irmão ou filho): não têm queixas, sempre foram aparentemente saudáveis e apenas porque tal relação familiar aumenta o seu risco de ter DC em cerca de 20% propõem-se a fazer as análises. Porquê? Porque se forem mesmo celíacos, quanto mais cedo se começarem a tratar, melhor…

Sim.

Embora a DC seja, classicamente, uma doença de crianças (geralmente com queixas clássicas de diarreia crónica, cólicas, distensão abdominal, má-nutrição ou atraso de crescimento) cada vez mais se reconhecem formas no adulto que passam despercebidas nas primeiras décadas de vida. Isso acontece porque a DC tem uma grande diversidade nas suas formas de apresentação clínica, ou seja, nos sinais e sintomas com que se manifesta inicialmente. Para além das formas típicas da doença, com as queixas clássicas já referidas, existem formas de doença que não são imediatamente aparentes, nem para o próprio indivíduo nem para o médico:

  • A DC pode manifestar-se de forma totalmente assintomática ou apenas com um ou outro sintoma não valorizados por ninguém. São formas silenciosas ou quase silenciosas, que persistem durante um período de vida considerável e que perduram ao longo do tempo. São exemplos disso o cansaço isolado e persistente com a  correspondente anemia ligeira (e crónica ao longo da vida); a osteoporose precoce; ou as alterações intestinais, vulgares e inespecíficas, de flatulência, de cólica abdominal e de obstipação. Os indivíduos podem ainda não manifestar qualquer sintoma e ter apenas uma deficiência nutricional detectada nas análises sanguíneas, como a deficiência de ferro, de vitamina B12 ou de ácido fólico.
  • O indivíduo pode ainda ter uma forma de DC classificada como  atípica ou extra-intestinal, com sintomas e sinais que,  à partida, não são de relacionar com uma doença gastrenterológica e, por isso, não chamam facilmente a atenção para o diagnóstico. São disso exemplos algumas doenças da pele (ex: dermite herpetiforme), da tiróide (ex: tiroidite auto-imune) ou do sistema nervoso (ex: dificuldade na marcha).

Podem ter, mas nem sempre as têm… nem as devem ter!

A DC caracteriza-se pela destruição (atrofia) da parede do intestino delgado. Como a absorção dos nutrientes se processa nesse órgão o celíaco pode estar em risco para algumas deficiências nutricionais. As mais frequentes são as deficiências de ferro, ácido fólico e vitamina B12 e o seu rastreio (em análises de sangue) é obrigatório no momento do diagnóstico e ao longo da vigilância de rotina do celíaco. Destaca-se que podem existir carências de vitaminas ou de minerais e não existirem deficiências proteicas nem calóricas: ou seja, um indivíduo pode ser gordo ou não ter emagrecido e, mesmo assim, ter deficiências nutricionais.

Caso se detectem deficiências no momento do diagnóstico, estas devem ser colmatadas na dieta ou através de suplementos (comprimidos ou injectáveis). Caso estas deficiências surjam ao longo do tempo, para além do seu tratamento adequado, deve-se logo levantar a hipótese da doença estar mal controlada por existir ingestão de glúten, voluntariamente ou acidentalmente (contaminação).

Um celíaco controlado deve ter o seu intestino totalmente recuperado e a funcionar em pleno. Neste caso, não deve existir qualquer carência nutricional, sendo fundamental a manutenção de uma dieta isenta de glúten, sempre rica e equilibrada do ponto de vista alimentar.

Sim, pode… desde que não o engula.

Os produtos cosméticos e para a pele ou cabelo, mesmo contendo glúten, não representam problema a não ser que sejam ingeridos. A doença celíaca (DC) é uma doença autoimune desencadeada pela presença de glúten no interior do intestino delgado. Só nesse caso, num celíaco, se desencadeiam as reacções inflamatórias que levam à destruição da parede intestinal e ao aparecimento dos sinais e sintomas que caracterizam a doença. Assim, não há qualquer problema na utilização de produtos com glúten… a não ser que esse produto possa chegar ao contacto da boca e ser ingerido, inadvertidamente. Imaginemos o caso de um batôn para os lábios, de um creme para a cara ou de um champô que se utiliza no duche. É simples prever que pequenas quantidades (mas suficientes para activar a doença) possam ser ingeridas. Para maior segurança, caso a situação se justifique, deve consultar a lista de ingredientes ou contactar o fabricante para maior informação.

Salienta-se que a dermite herpetiforme, uma manifestação cutânea de uma intolerância ao glúten, surge porque há ingestão de glúten e não por contacto deste com a pele. Assim, o tratamento desta doença de pele é, tal como o da doença celíaca, a dieta isenta de glúten. Caso utilize um produto para a pele e este lhe pareça causar inflamação local ou qualquer tipo de reacção cutânea contacte o seu médico assistente ou dermatologista: pode ser uma alergia a um componente desse produto mas não será uma manifestação da DC.

Não necessariamente.

A intolerância à lactose é uma situação em que não se consegue digerir a lactose (um açúcar presente no leite dos mamíferos), por falta de uma enzima, a lactase. É uma doença muito frequente e vulgar, que pode aparecer ao longo da vida (mais precoce ou mais tardiamente) e que raramente representa uma situação grave. Os seus sintomas (cólicas, diarreia, flatulência e distensão abdominal) confundem-se com os da DC, podendo tornar-se um problema adicional para o celíaco.

Na verdade, não parece existir maior frequência de intolerância ao açúcar do leite nos indivíduos celíacos. Contudo, como a lactase (a tal proteína necessária para digerir a lactose) se localiza ao nível das vilosidades intestinais, enquanto a DC não estiver controlada e o intestino não recuperar pode existir deficiência de lactase e, por isso, intolerância à lactose. Quando se verificar a recuperação total das vilosidades é possível que o celíaco possa consumir lactose novamente, sem problemas.

É assim frequente aconselhar um celíaco recém diagnosticado e com sintomas a não consumir lactose e, mais tarde, quando estiver bem, reintroduzi-la na sua alimentação. O aparecimento de queixas associadas à ingestão de lactose permitirá fazer o diagnóstico e até perceber qual o volume de lactose tolerado por aquele indivíduo.

Depende…

Muitos celíacos não têm qualquer percepção de que ingeriram glúten: simplesmente não notam nada de diferente no seu corpo quando transgridem a dieta, mas isso não significa que essa ingestão de glúten não tenha consequências.  Silenciosamente, o glúten vai promovendo a destruição das vilosidades e exercendo o seu impacto negativo em vários órgãos e sistemas do organismo.

Contudo, há celíacos que têm a sensação de que ingeriram glúten: têm sintomas, bem definidos ou vagos,  que podem ser semelhantes ou diferentes daqueles que levaram ao diagnóstico. Há relatos, após ingestão de glúten, de sintomas típicos da DC (cólicas, diarreia, flatulência e distensão abdominal) bem como de queixas variadas (como por exemplo as de refluxo gastro-esofágico, de insónias, de lesões da pele) ou de, simplesmente, um cansaço ou mal-estar geral pouco definido. Um celíaco pode perceber que o seu organismo reage sempre com determinado padrão e de forma semelhante, aprendendo então a reconhecê-lo. No entanto, não é certo que sempre que se coma glúten que essas queixas apareçam – não se pode confiar em qualquer sintoma como indicador fiável de que se comeu glúten. Assim, são fundamentais todos os cuidados na manutenção da dieta isenta de glúten.

Sim, faz mal.

A doença celíaca (DC) obriga ao rigoroso cumprimento, sem exceção, de uma dieta isenta de glúten. O glúten, no intestino de um celíaco, vai estimular o sistema imunitário ativando  reações autoimunes que têm como um dos objetivos a destruição das células intestinais. O que se observa, ao microscópio, nas biopsias do intestino de um celíaco é o resultado dessa destruição de células intestinais: a atrofia intestinal, que é característica da DC.

A estimulação surge quando as células do sistema imunitário entram em contacto com partículas de glúten na parede intestinal. Esse contacto não é necessariamente dependente do volume de glúten ingerido. Isto significa que uma ínfima e minúscula porção de glúten pode ter a capacidade e o potencial de despertar a autoimunidade e promover a destruição intestinal em larga escala. Assim sendo: glúten, zero!  Sempre.

Sim, deve.

Reconhece-se que a DC é uma patologia de incidência familiar, resultado da partilha dos genes entre pessoas aparentadas. A probabilidade de um familiar de primeiro grau de um celíaco (pai, mãe, irmãos ou filhos) ter DC é de cerca de 10%. Isto justifica a realização de um rastreio que é, na maioria dos casos, feito por serologia (análises de sangue).

Assim, mesmo nas crianças saudáveis, não apresentando qualquer queixa, esse rastreio da DC está recomendado caso um dos pais ou um irmão seja celíaco. Não esquecer que a DC pode cursar durante anos com queixas mínimas e ligeiras ou instalar-se como doença assintomática e silenciosa, sendo o diagnóstico precoce fundamental para evitar o impacto negativo desta patologia ao longo do tempo.

Não obrigatoriamente. Mas deve ser regularmente acompanhada pelo médico.

O diagnóstico de doença celíaca permite, com a manutenção rigorosa da dieta isenta de glúten (DIG), a recuperação do intestino delgado e a normalização das deficiências nutricionais porventura existentes. O celíaco sente-se progressivamente melhor, notando o desaparecimento das queixas que o afligiam e, curiosamente, dando conta de que outros sintomas que não valorizava acabaram por melhorar ou desaparecer. Caso o indivíduo tenha doenças de outros órgãos associadas à sua doença celíaca (tiróide, pele ou articulações, por exemplo), com o início da DIG notar-se-á provavelmente uma melhoria ou um melhor controlo dessas outras patologias. Este processo de recuperação pode ser lento e deve ser acompanhado e monitorizado pelo médico e pelo dietista.

Embora não existam regras definitivas, o programa de seguimento médico de um celíaco depende de vários fatores: idade de diagnóstico, gravidade dos sintomas nessa altura, evolução clínica ao longo do tempo e queixas atuais; existência de doenças associadas ou de complicações de doença celíaca; magnitude das alterações nos exames complementares de diagnóstico; cumprimento e complicações da DIG (aumento de peso, emagrecimento ou obstipação, por exemplo).

Na presença de um celíaco diagnosticado há anos, sem queixas clínicas e com um ótimo controlo dietético, sugere-se uma visita anual ao seu médico e dietista. Na consulta, esses profissionais apercebem-se do estado clínico e nutricional do indivíduo, salientando pormenores porventura não valorizados e atribuindo-lhes, ou não, importância. Ir à consulta não significa, necessariamente, ter que realizar exames médicos mais complexos como a endoscopia, embora se considere rotina o pedido de análises sanguíneas. Contudo, caso seja considerada útil a prescrição de qualquer exame, a sua solicitação é sempre personalizada e feita, como referido, de acordo com o contexto geral do celíaco.

A doença celíaca é uma patologia diversificada que, como qualquer outra, inclui grupos diversos de doentes, com gravidade e características diferentes. No que se refere ao risco de um doente celíaco se infectar com o vírus SARS-CoV-2, causador da doença covido-19, não se pode generalizar e, de acordo com a informação científica actualmente disponível, há que considerar 2 grupos:

a) os celíacos controlados e sem risco aumentado

A doença celíaca controlada, apesar de ser uma doença crónica, não é habitualmente considerada debilitante nem causadora de imunodeficiência (mau funcionamento do sistema imunitário). Assim, não existe, até ao momento, qualquer informação de que um celíaco controlado estará em maior risco de contrair covid-19. Os celíacos controlados devem seguir, como o resto da população, as recomendações gerais das autoridades de saúde, que salientam a importância do distanciamento social, da utilização de máscara facial, da etiqueta respiratória e da desinfecção/lavagem frequente das mãos. Adicionalmente devem manter o rigor da sua dieta isenta de glúten sabendo-se que o contacto inadvertido ou a contaminação com glúten não os coloca automaticamente no grupo de risco.

b) os celíacos com risco aumentado

Pertencem a este grupo os celíacos que:

  • tenham pelo menos 60 anos;
  • tenham a sua doença não controlada, ou seja, doença ativa. São os celíacos sintomáticos (com queixas), emagrecimento, malnutridos, com evidentes alterações nas análises ou noutros exames complementares;
  • apresentem complicações da doença, nomeadamente doença celíaca refractária;
  • estejam a ser tratados com imunossupressores, que são medicamentos que alteram a capacidade de o sistema imunitário combater as infeções. São exemplos destes fármacos a cortisona, a azatioprina e um conjunto de medicamentos genericamente chamados “fármacos biológicos”;
  • apesar de estarem controlados, tenham outras doenças que os colocam em risco para a covid-19 como, por exemplo, a diabetes, a doença cardiovascular (hipertensão, risco atual de ou história passada de enfarto do miocárdio ou cerebral – vulgarmente chamado AVC), a doença respiratória (doença pulmonar obstrutiva crónica) ou o cancro.

Estes celíacos são considerados de risco e, por isso, devem recorrer ao seu médico assistente para melhor esclarecimento e orientação. Globalmente deverão ter cuidados ainda mais meticulosos no que se refere às medidas de contenção da infecção e poderão beneficiar de atitudes mais restritas de isolamento social (de acordo com a evolução da pandemia) bem como da proteção conferida pela vacinação profilática contra a gripe sazonal e contra outras infecções bacterianas.

Em Portugal, deve ser rigorosamente cumprido o calendário das vacinas estipulado no Plano Nacional de Vacinação. A questão levantada coloca-se em relação a vacinas não contempladas nesse plano, portanto, vacinas consideradas extra. E quanto a isso, não há consenso internacional sobre os conselhos a dar aos celíacos, considerando unicamente a doença celíaca como factor de risco.

Existe uma situação específica no celíaco que justifica a prescrição de algumas vacinas não consideradas no plano de vacinação: o hipoesplenismo. É um facto reconhecido que uma minoria (cerca de 30%) dos celíacos podem ter uma diminuição da função do baço, chamada hipoesplenismo. O baço é um órgão do sistema linfático que participa no bom funcionamento do sistema imunitário e das defesas do organismo. Entre os celíacos cujo baço não funciona a 100% – os tais que têm hipoesplenismo –, apenas uma pequena fração tem repercussão disso na sua vida: esses terão um aumento da suscetibilidade a algumas infeções bacterianas, originando septicémia, pneumonia ou meningite. Como existem actualmente vacinas eficazes para alguns desses microorganismos, os celíacos com hipoesplenismo podem ser vacinados com as vacinas antipneumococo (vulgo vacina da pneumonia), antimeningococo (vulgar vacina da meningite) e anti-hemophilus.  Nestes indivíduos é também aconselhada a vacinação anual da gripe, não porque tenham maior probabilidade de contrair essa doença viral, mas porque a própria gripe pode complicar-se por infecções bacterianas secundárias, que se aproveitam assim do estado de fragilidade do organismo.

A dificuldade na prática corrente é como saber se um celíaco, mesmo controlado, tem ou não deficiente funcionamento do baço, ou seja, hipoesplenismo. Isso pode não ser fácil de concluir, uma vez que não existe um único exame ou teste que o sugira ou negue com um bom grau de fiabilidade. Existem alguns exames complementares que o médico pode solicitar e que podem indicar a existência de hipoesplenia e, então, sugerir a tal necessidade de vacinação suplementar. Essas decisões (de estudar a função do baço e/ou vacinar um celíaco) nem sempre são consensuais entre os médicos e devem ser discutidas entre o celíaco e o seu clínico assistente.

De qualquer forma, como exemplificado na questão anterior, não esquecer que mesmo um celíaco controlado e com função do baço normal pode ser considerado de risco para determinadas infeções apenas face à sua idade ou simplesmente por ter outras doenças. Nessa situação, poderá efetivamente beneficiar de vacinação além da prevista pelo Plano Nacional de Vacinação.

A medula óssea é o tecido esponjoso que se localiza no interior dos ossos. Na sua composição incluem-se células que têm a capacidade de se multiplicar e dar origem a diferentes constituintes do sangue. É aí que se “fabricam” as células que circulam nos vasos sanguíneos, nomeadamente os glóbulos vermelhos (que transportam o oxigénio a todas as outras células do organismo), os glóbulos brancos (que, entre outras funções, nos protegem de infeções) e as plaquetas (que são fundamentais para a nossa coagulação). Na presença de uma doença ou situação que afecte gravemente o funcionamento da medula (cancro, infeção, alterações do metabolismo logo à nascença ou em resultado de quimioterapia ou radioterapia, por exemplo) os indivíduos podem manifestar sintomas variados relativos a deficiências das células sanguíneas, como por exemplo, anemia, infeções recorrentes ou hemorragias graves. Estas manifestações por deficiência da função medular podem ser graves e eventualmente fatais.

O transplante de medula é um tratamento que permite substituir a medula óssea doente por outra saudável. O transplante pode ser autólogo (quando se utiliza medula do próprio doente, previamente recolhida e guardada, como por exemplo antes de um tratamento de quimioterapia ou radioterapia) ou alogénico (feito com medula de uma outra pessoa, dadora).  Em qualquer uma das circunstâncias pretende-se que células saudáveis de medula se fixem na medula do indivíduo doente, multiplicando-se e curando-o ao restituir a sua capacidade de produzir sangue.

O procedimento médico é complexo e exigente, e o primeiro passo, no caso do transplante com células de outra pessoa, é encontrar alguém adequado – é necessário um dador que, após estudo e comparação do seu sistema imunitário com o do recetor (quem recebe o transplante), se revele compatível. Ao reconstituir do princípio o sistema imunitário, a intenção é reduzir a hipótese de as células do dador reconhecerem os órgãos do recetor como estranhos e atacarem-nas irreversivelmente.

Os critérios para alguém se inscrever como dador de medula variam um pouco em todo o mundo, mas, regra geral, ter uma doença auto-imune poderá ser mesmo limitante. Por um lado, o procedimento médico a que o dador é habitualmente sujeito antes da recolha da sua medula para doação poderá agravar a doença autoimune existente. Por outro lado, a doença autoimune no dador poderá ser causa de complicações no recetor.

Os celíacos, em Portugal, e de acordo com as regras do Instituto Português do Sangue e Transplantação (IPST), não podem doar medula óssea. A doença celíaca é um critério de exclusão de admissão para doação de medula. Está incluída numa lista variada, de que são exemplos a diabetes, a fibromialgia, o glaucoma ou ter tido hepatite B ou C.

No entanto, no que se refere à dádiva de sangue por celíacos, segundo o IPST e em comparação com a doação de medula, as regras não são tão estritas. Embora a doença celíaca seja uma doença autoimune, não está definitivamente negada a doação de sangue. O ser considerado “Apto” vai depender da avaliação médica efetuada no momento da dádiva, considerando a situação clínica (pretende-se um celíaco assintomático, controlado e saudável) e a terapêutica (uma dieta rigorosa isenta de glúten). Para essa avaliação médica poderá ser útil um relatório do médico assistente com um resumo clínico atualizado da situação do celíaco.

Provavelmente sim, caso a dieta esteja a ser rigorosamente cumprida.

Logo após a certeza do diagnóstico, o celíaco deve iniciar uma dieta isenta de glúten. Aprender a cumprir rigorosamente uma dieta com estas características pode não ser fácil e, também por isso, deve ser mantido um acompanhamento regular pelo nutricionista. Ao retirar o glúten da alimentação, deixa de existir ativação do sistema imunitário e, por isso, reduz-se progressivamente o processo inflamatório que está na base da destruição da mucosa do intestino delgado. Isto significa que logo que se inicia a dieta o organismo começará a recuperar. Alguns sintomas podem melhorar muito rapidamente (por vezes, passados alguns dias, nota-se melhoria no cansaço, na falta de forças e de energia vital) mas outros podem demorar mais tempo – por exemplo, a diarreia, a distensão abdominal e as cólicas podem apenas melhorar significativamente depois de algumas semanas. Ao mesmo tempo, os valores laboratoriais que estavam alterados – por exemplo, anemia, vitamina B12, cálcio e ferro baixos ou análises hepáticas aumentadas – têm tendência para recuperar progressivamente, reflectindo a tendência para melhoria sentida pelo celíaco.

Após iniciar a dieta isenta de glúten e acompanhando a melhoria dos sintomas e das análises gerais, observa-se uma redução dos anticorpos sanguíneos característicos da doença celíaca, nomeadamente do anticorpo transglutaminase tissular-IgA (TGT), um dos mais utilizados no estudo dos celíacos. Em cerca de 90% dos celíacos estes anticorpos são positivos e podem ser considerados, grosseiramente, uma medida da atividade inflamatória causada pelo glúten. Ora, se a dieta for cumprida, é de esperar que o seu valor no sangue reduza progressivamente.  Esta diminuição pode ser mais evidente de pessoa para pessoa, mas, na maioria dos indivíduos, os anticorpos ficam negativos ao final de um ano de dieta rigorosa.

Contudo temos que considerar duas situações:

  • Cerca de 10% dos celíacos que tinham os anticorpos elevados no momento do diagnóstico e que cumprem uma dieta rigorosa nunca conseguirão negativá-los – podem reduzir bastante o seu valor, mas serão sempre positivos. E isso acontece sem querer significar que o intestino não recupere totalmente da sua atrofia.
  • Há celíacos cujos anticorpos apesar de se tornarem negativos não têm uma recuperação total do intestino.

Por esses motivos – poderem existir celíacos positivos com intestino recuperado e celíacos negativos ainda com inflamação intestinal – é importante realizar um controlo por endoscopia com repetição das biópsias do duodeno/intestino delgado. A melhor altura para repetir essa endoscopia varia conforme o caso, mas, habitualmente, aguarda-se, pelo menos, por 1 ano de rigorosa dieta isenta de glúten.

Nunca acreditar que “se comer glúten, eu sinto logo”…

A reação de um celíaco sob dieta isenta a uma ingestão de glúten, vulgarmente chamada “glutenização” (acidental ou por contaminação), pode variar conforme o indivíduo:

Alguns ingerem glúten e sentem passados minutos ou horas sintomas que podem ser variados, mas que, geralmente, na mesma pessoa mantêm o mesmo padrão: má disposição geral, náuseas, vómitos, diarreia, cólicas ou flatulência, por exemplo; Outros, ao ingerir glúten não têm qualquer sintoma – o que os pode levar à conclusão falsa e perigosa de que “afinal, não me faz mal!” Há também celíacos que apenas referem sintomas se o volume de glúten ingerido for superior a determinada quantidade, nem sempre, aparentemente, a mesma é variável de pessoa para pessoa… Porque a variabilidade das reações à “glutenização” é grande, há que manter o rigor na dieta isenta de glúten e não cair no erro de que a sua alimentação “está bem controlada porque não sinto nada, e se comer glúten percebo imediatamente!”

2022

A doença celíaca é uma situação potencialmente complexa cujo diagnóstico e seguimento deve ser efetuado por um médico, com base na história clínica e no resultado de exames complementares de diagnóstico, nomeadamente em análises sanguíneas e na endoscopia com biópsias do duodeno. Esta é a única forma no adulto de definitivamente se excluir, afirmar ou monitorizar uma doença celíaca.

Têm sido divulgados e disponibilizados vários testes “rápidos” para utilização no contexto da doença celíaca, alegadamente no seu rastreio e/ou seguimento através da determinação dos anticorpos*. São testes de variadas marcas, de resultado rápido, de venda livre em estabelecimentos comerciais ou online e que se destinam a ser feitos em casa, pela própria pessoa (autotestes). Genericamente, é necessário colocar uma gota de produto biológico (habitualmente sangue) num compartimento de uma pequena placa e aguardar uns minutos pelo resultado.

Ao avaliar o papel deste tipo de autotestes colocam-se 2 questões principais: uma relativa ao desempenho dos testes e outra relacionada com o seu interesse prático, no rastreio/diagnóstico da doença e no seguimento ao longo do tempo de um celíaco.

Os testes são bons? Ou seja, avaliam bem aquilo a que se propõem?

Estes testes rápidos têm como alvo determinar a existência no sangue (ou na saliva) de anticorpos específicos para a doença celíaca (o transglutaminase tecidular e/ou o gliadina desaminada), nas suas variantes IgA e/ou IgG. Como qualquer outro dispositivo médico comercializado em Portugal, estes autotestes obedecem a exigências específicas em termos de desempenho e segurança e são aprovados pelas autoridades reguladoras. Genericamente, não particularizando qualquer teste, poder-se-á dizer que sim: a tecnologia presente nos testes adequa-se ao objectivo a que se propõem, que é detetar a presença de determinados anticorpos num produto biológico.

Mas os testes têm algum interesse clínico? Ou seja, são úteis no rastreio/diagnóstico ou no seguimento da doença celíaca?

O papel destes testes no rastreio/diagnóstico da doença celíaca limita-se aos resultados positivos (que, claro, carecem sempre de avaliação clínica e de estudo laboratorial para que sejam confirmados e valorizados adequadamente). Um resultado negativo, no contexto de rastreio/diagnóstico, não permite negar a existência da doença e pode mesmo atrasar ou impedir o seu diagnóstico, com repercussões significativas sobre a saúde.

Adicionalmente, como método de seguimento da doença celíaca, estes testes não têm interesse clínico não sendo – exatamente por isso – aconselhados pelas principais sociedades internacionais gastrenterológicas. Assim, a obtenção de um resultado negativo num destes testes não permite, nem ao médico nem ao celíaco, tirar conclusões adequadas sobre o estado da doença:

  • Em alguns autotestes (não são todos iguais), o tipo de anticorpos e de imunoglobulinas alvo que se detetam não têm papel relevante no manejo da doença celíaca no adulto (como o anticorpo antigliadina desamimada – IgG). Assim, trata-se apenas de um resultado negativo num teste, desde o início, não adequado ao estudo da doença;
  • Um resultado negativo num qualquer teste não exclui uma doença celíaca descompensada. Para além dos falsos-negativos, a interpretação dos resultados é condicionada por determinadas situações sendo exemplos um celíaco que não tem qualquer anticorpo específico (sendo sempre negativo, mas com doença celíaca) ou alguém que tem deficiência de IgA (sendo também negativo nos anticorpos-IgA, mesmo com doença celíaca);
  • Um celíaco que obtenha um autoteste negativo fica com a falsa segurança de que a doença está controlada, não sendo isso necessariamente verdade. Não existe obrigatoriamente uma relação estreita entre a subida dos anticorpos e o incumprimento dietético: um celíaco pode erradamente ingerir glúten, manter-se com anticorpos negativos e estar mesmo assim sujeito ao processo destrutivo inflamatório do glúten sobre o seu organismo.

Desta forma, atualmente não se recomendam os autotestes para a doença celíaca, pois a sua utilização poderá colocar em causa o adequado acompanhamento clínico. Sempre que persista alguma questão em relação a esta patologia, esclareça-a com o seu médico assistente.

* Não confundir estes testes rápidos de deteção de anticorpos com outros de deteção de péptidos imunogénicos do glúten na urina, utilizados para estudar o rigor de uma dieta isenta de glúten.

A doença celíaca (DC), no adulto ou na criança, pode ser difícil de diagnosticar essencialmente por dois motivos. Por um lado, podem existir queixas muito ligeiras ou pouco frequentes que não despertam logo essa suspeita diagnóstica. Por outro, os exames médicos de diagnóstico disponíveis têm algumas características especiais, que levam a que a sua interpretação possa ter resultados diferentes de um simples “sim” ou “não”. No entanto, considera-se que deve sempre ser feito um esforço para afirmar ou excluir a DC, uma vez que na presença do diagnóstico a dieta isenta de glúten é de primordial importância. De facto, a instituição precoce desse tratamento eficaz – apenas nutricional e isento de fármacos – parece evitar o aparecimento de outras patologias auto-imunes e de complicações importantes ao longo da vida.

Dos vários exames que ajudam no diagnóstico, para além das análises sanguíneas “de rotina” que podem refletir o estado geral do organismo (nomeadamente em relação à absorção intestinal), salientam-se as análises dos anticorpos e o teste genético (ambos realizados no sangue) e a endoscopia digestiva alta com biópsias do duodeno (primeira porção do intestino). O pedido destes exames deve ser feito de acordo com o caso específico de um indivíduo, podendo existir variações em diferentes pessoas na forma como a investigação é conduzida. Pretende-se reunir toda a informação útil e, no final, perceber se é possível fazer um diagnóstico que idealmente deve ser efetuado com elevada certeza e probabilidade.

Assim, o médico tem à sua disposição o estudo dos anticorpos no sangue, o teste genético e a endoscopia alta com biópsias intestinais:

1. Pesquisa de anticorpos no sangue ou serologia (análise aos anticorpos anti-transglutaminase tissular, anti-gliadina desaminada e/ou anti-endomísio): são considerados muito específicos da DC e alteram-se sob dieta isenta de glúten. O seu estudo é praticamente considerado obrigatório, pois são actualmente de fácil acesso e de relevante interesse no diagnóstico inicial e no seguimento da DC. Na criança (mas não no adulto), se forem fortemente positivos e em determinadas circunstâncias, podem mesmo dispensar a realização de endoscopia com biópsia. Os 3 tipos de anticorpos referidos não são iguais, não têm o mesmo significado e a sua utilização não é indiferente perante determinado caso clínico. Mesmo sendo negativos, porque existem casos de DC sem anticorpos, a investigação perante uma forte suspeita clínica não deve parar por aqui.

2. Teste genético (para os genes HLA-DQ2 e HLA-DQ8): é uma análise que, não sendo obrigatória, se pode revelar útil na investigação, mesmo quando se está sob dieta isenta de glúten pois o resultado não se altera nessa circunstância. A sua utilização baseia-se em dois factos importantes para o raciocínio diagnóstico.

a) Na população geral, cerca de 30% das pessoas têm esta genética positiva. Contudo, desses indivíduos, menos de 1% terá DC. Isto quer dizer que um resultado genético positivo não significa necessariamente que se seja celíaco. Pode-se ter apenas um terreno genético favorável – uma predisposição genética – mas sem nunca expressar a doença;

b) Praticamente todos os celíacos (até 99% em alguns estudos) têm genética positiva, ou seja, têm pelo menos um dos genes da DC. Conclui-se que quem tem genética negativa (não tem nenhum dos genes da DC) não é, com elevado grau de probabilidade, celíaco.

Desta forma, a informação que o teste genético nos fornece é especialmente útil quando este é negativo: permite afirmar que não se tem DC. Quando positivo, não confirma a doença mas deixa tudo em aberto. Por estes motivos (e também porque é dispendioso) o seu pedido deve ser feito de forma criteriosa e de acordo com a situação clínica.

3. Endoscopia alta com biópsias do intestino delgado (duodeno): é um exame obrigatório no adulto para que se possa afirmar o diagnóstico, devendo-se ter sempre presente que a dieta sem glúten influencia os resultados. A observação ao microscópio das biopsias do duodeno permite caracterizar o tipo de inflamação e avaliar o grau de destruição (atrofia) das vilosidades, estruturas primariamente afectadas na DC. Esta análise microscópica pode assim confirmar a existência da DC, excluí-la ou até sugerir outros diagnósticos. Contudo, em alguns casos, o estudo das biópsias pode não ser conclusivo.

Na prática médica, a DC nem sempre é fácil de diagnosticar. Nos casos em que tudo encaixa bem e o puzzle se compõe facilmente, o diagnóstico pode ser muito linear, não precisando sequer do estudo genético: por exemplo, alguém com queixas típicas (diarreia, dor e distensão abdominal e emagrecimento), análises de sangue gerais sugestivas (sinais laboratoriais de má absorção), serologia positiva (nomeadamente anticorpos anti-transglutaminase IgA elevados) e biópsias intestinais mostrando atrofia. Noutros casos pode ser difícil afirmar ou excluir o diagnóstico mesmo recorrendo a todos os exames complementares disponíveis. Por isso, na suspeita de uma doença celíaca e antes de iniciar uma dieta isenta de glúten, deve consultar o seu médico assistente. Assim poder-se-á estabelecer uma estratégia de diagnóstico que optimize as hipóteses de se obter um diagnóstico correcto e fiável.

2021

Cumprir com rigor uma dieta celíaca implica eliminar todas as potenciais fontes de glúten da alimentação. Todo o esforço despendido numa cuidada seleção dos alimentos (observando a regra dos alimentos gluten free, com conteúdo de glúten inferior a 20 partes por milhão ou 20 mg/kg) poderá ser posto em causa por fontes menos óbvias de glúten, nomeadamente através da contaminação cruzada.

Partindo do princípio de que se selecionam corretamente os alimentos e que se tem em conta a informação presente na sua rotulagem, a principal causa de ingestão inadvertida de glúten é a contaminação cruzada. Esta contaminação acontece de forma direta quando um alimento seguro entra em contacto com outro que contém glúten, como por exemplo numa salada à qual foram adicionados pedacinhos de pão crocante ou num gelado no qual se colocou um pau de bolacha no topo. Pode ainda existir contaminação indireta quando o glúten chega ao alimento seguro através das mãos, de um utensílio ou de um equipamento/aparelho, como uma colher de pau ou uma torradeira.  O grau de contaminação poderá, claro, variar, mas sabe-se que mesmo ínfimas quantidades de glúten podem descompensar uma doença celíaca controlada.

Para evitar a contaminação cruzada na cozinha, claro que o mais seguro é que não entre aí glúten algum, tornando-se uma cozinha gluten free. Caso isso não seja possível, há regras básicas de separação, arrumação e acondicionamento dos alimentos com e sem glúten que devem ser cumpridas. Existem também regras que devem também ser respeitadas em relação aos utensílios e equipamentos de forma a não serem veículos de transporte de partículas de glúten em cozinhas mistas, com alimentos com glúten.

No que se refere aos utensílios (loiça de mesa, talheres de cozinha, espátulas, rolos de massa, panelas, caixas plásticas, espremedores, tábuas de corte, etc, para além de garantir que estão sempre bem lavados, devem ser escolhidos materiais que não sejam porosos e que não rachem ou risquem facilmente. Se isso acontece, podem permanecer partículas de glúten aprisionadas no próprio material e suas rugosidades e serem assim fonte de contaminação cruzada clinicamente significativa. É por isso preferível optar por materiais como o inox, o alumínio, a porcelana, a cerâmica vidrada ou o vidro, facilmente laváveis. A madeira, o barro, o bambu e o próprio plástico são materiais porosos a evitar. Os materiais ditos “antiaderentes”, caso estejam degradados ou riscados, podem também reter partículas de glúten apesar da lavagem habitual. Adicionalmente, numa cozinha “mista”, pode ser útil manter sempre à parte os utensílios dedicados à alimentação isenta de glúten, marcando-os e guardando-os separadamente e apenas para esse objectivo.

Em relação aos equipamentos (como, por exemplo, a torradeira, a tostadeira, a fritadeira, a máquina do pão, o forno ou o micro-ondas) o risco é, mais uma vez, da transferência de partículas alimentares contendo glúten. A regra será a da higienização eficaz do electrodoméstico que foi utilizado com glúten. Contudo, há equipamentos em que isso se torna desafiante, como no caso clássico da torradeira, que deve ser dedicada ao pão sem glúten uma vez que é difícil a sua limpeza em segurança. Da mesma maneira, as fritadeiras devem ser utilizadas apenas para alimentos sem glúten, pois os resíduos de frituras anteriores com glúten (presentes no material e no óleo) podem representar perigo para o celíaco. Deve-se também ter atenção à utilização do forno e micro-ondas, uma vez que a ventilação dos aparelhos pode fazer circular o glúten no seu interior. Resumindo, seja qual for o equipamento em questão, os princípios são os mesmos: limpeza completa e segura antes da utilização para o celíaco e, se tal for difícil ou pouco prático, será preferível dedicar o apetrecho aos alimentos sem glúten.

Outras regras simples, a aplicar em cozinhas não dedicadas apenas a alimentação isenta de glúten, são:

  • Armazenamento em local separado dos produtos isentos de glúten, sempre devidamente identificados;
  • Limpeza húmida das superfícies (como por exemplo chão, bancadas, prateleiras, mesas) e não a seco (varrer ou aspirar), para não levantar poeiras;
  • Utilização de panos e esponjas comuns, sem necessidade de separação ou de tratamento diferente, desde que sempre bem lavados;
  • Lavagem dos utensílios/loiças (preferencialmente de inox, alumínio, vidro, porcelana ou cerâmica vidrada) à mão (com detergente) ou na máquina, como habitualmente;
  • Utilização exclusiva de determinados equipamentos para a alimentação isenta de glúten (como por exemplo torradeira, tostadeira ou fritadeira);
  • Preparação, em primeiro lugar, das refeições sem glúten.

A doença celíaca (DC) é uma patologia que se pode manifestar em qualquer idade, com sintomas e sinais variados, alguns pouco evidentes e que obrigam a que se tenha um elevado grau de suspeição se quisermos chegar a esse diagnóstico. Os sintomas típicos, clássicos, essencialmente do foro intestinal – dor abdominal/cólicas, distensão, flatulência, diarreia e emagrecimento – surgem frequentemente em crianças e não passam habitualmente despercebidos quando há intervenção médica. Hoje em dia, com o aumento do conhecimento generalizado sobre a doença e com a melhoria dos métodos de diagnóstico, mais celíacos são diagnosticados em idades precoces, pediátricas. Isso torna-se fundamental, pois assim é possível minimizar o impacto da doença ao longo da vida desde que se obtenha um bom controlo através, claro, da dieta. A maioria das vezes em que o diagnóstico é feito na idade adulta, há um atraso até à sua confirmação porque as queixas são geralmente extraintestinais, e não indiciam imediatamente a suspeita de DC.

As pessoas doentes podem queixar-se de fadiga persistente, cefaleias, alterações do humor, mialgias, aftas na boca, perda de cabelo, dores articulares, ansiedade/depressão, osteoporose, problemas de pele ou da tiróide. Na criança pode constatar-se apenas atraso no crescimento (baixa estatura), atraso na puberdade ou dificuldades de aprendizagem. Há casos em que os únicos indícios poderão ser alterações laboratoriais como anemia por falta de ferro, deficiência de vitaminas ou alterações nas análises do fígado.

Por esse motivo, se uma pessoa tiver sintomas ligeiros ou inaparentes, podem ver passar vários anos até que seja diagnosticado: alguns estudos referem que, entre os primeiros sintomas, o ir ao médico e, finalmente, o ter o diagnóstico, o atraso médio é de 9 anos.

Depois de realizado o diagnóstico, especialmente na adolescência ou no adulto jovem, surgem outras dificuldades. São idades difíceis e especiais no que se refere à auto afirmação, irreverência e necessidade de integração em grupos, de amigos e na escola, podendo colocar em causa o único tratamento eficaz da DC: a dieta. Torna-se assim fundamental que, especialmente enquanto na sua alçada, os pais consigam transmitir às crianças a importância do rigor da dieta, ensiná-las a eficazmente lidar com ela e torná-las o melhor veículo de informação e de divulgação da DC no seu círculo de amigos e familiares. É igualmente importante que nessas idades jovens se crie e mantenha o hábito de um seguimento regular, médico e nutricional, de forma a garantir uma recuperação total do organismo e a remissão dos sinais e sintomas existentes. Porque são muitas vezes, como referido, queixas inespecíficas e ligeiras, essa avaliação pode ser mais difícil. Assim, os pais devem estar alerta para qualquer pista que possa ser importante e que pode passar por existir, além das queixas físicas evidentes, mau desempenho escolar, dificuldade de integração social, isolamento, ansiedade ou mesmo sinais de depressão.

As associações e grupos de celíacos, que filtram a informação aos jovens e oferecem formação cientificamente validada, facilitam em muito, aos pais e às crianças, a aprendizagem sobre todas estas vertentes da doença celíaca.

A doença celíaca (DC) tem, reconhecidamente, interferência com a saúde da mulher, na fertilidade, na gravidez e na amamentação e não são raros os casos de celíacas diagnosticadas no período peri-gravidez.

Sabe-se que a DC pode ser a causa de dificuldade em engravidar e o seu rastreio faz parte da investigação dos casos de infertilidade. Por outro lado, uma mulher com DC descompensada (ou activa) tem maior probabilidade de ter abortos espontâneos, bebés com baixo peso ao nascer e, até, maior probabilidade de morte fetal. O período de amamentação também parece ser encurtado se a DC não estiver bem controlada.

A DC pode mesmo ser diagnosticada durante a gravidez. Claro que não terá sido a gestação a “causa” da doença, mas essa gravidez terá tornado evidentes deficiências nutricionais ou fenómenos auto-imunes numa mulher até então aparentemente saudável. Mas como interfere a DC na gravidez? Essencialmente de 2 formas:

  • Por um lado, através das deficiências nutricionais que, se a DC não estiver controlada, podem-se tornar ainda mais manifestas. A gravidez representa uma fase de grande consumo e necessidade de nutrientes, quer para o metabolismo da mãe quer do bebé. Assim, as dificuldades de absorção, especificamente de vitaminas e minerais, nomeadamente vitaminas do grupo B, vitamina D, ferro, magnésio, zinco e cobre vão ter enorme impacto, claro, na saúde da mãe e no desenvolvimento do bebé.
  • Por outro lado, a DC através dos anticorpos que a caracterizam (nomeadamente o anticorpo anti-transglutaminase tissular) podem originar fenómenos auto-imunes na placenta e no útero, com consequente “inflamação” e assim condicionando também a evolução da gravidez.

Por estes motivos – e, claro, por muitos, muitos outros – a dieta isenta de glúten é fundamental e obrigatória numa mulher que pretende engravidar. É importante saber que uma celíaca compensada com uma dieta bem cumprida tem exactamente as mesmas probabilidades de complicações e de sucesso se quiser engravidar e ter filhos. Fará então parte dos planos para engravidar só o fazer quando tiver a DC controlada! Durante a gravidez a mulher celíaca está sujeita, como qualquer pessoa, à ingestão inadvertida de glúten. Essa contaminação pode ou não ser sintomática, isto é: não nos devemos fiar em determinados sintomas que conhecemos em nós para afirmar que fomos ou não contaminados. É muito perigoso pensar que “se for contaminado eu sei logo” ou que “eu sinto que como glúten”, porque a maioria dos casos de contaminação são totalmente assintomáticos. Na verdade, existem casos em que os celíacos ingerem inadvertidamente glúten e têm sintomas, mas isso só servirá para reforçar a ideia de que a dieta tem que ser rigorosa e sem descuidos.

E se uma contaminação inadvertida realmente acontecer, as tais análises aos anticorpos têm algum interesse para ter a certeza que existiu mesmo contaminação? É muito difícil ter certezas de contaminação, porque os anticorpos podem não aumentar obrigatoriamente ou podem fazê-lo apenas mais tarde. Por outro lado, não terá na grande maioria dos casos algum interesse clínico saber se os anticorpos aumentaram após suspeita de contaminação, porque isso não vai mudar em nada a atitude: dieta rigorosamente isenta de glúten. O que está feito não pode ser desfeito, mas há que prevenir que isso aconteça novamente.

Não esquecer que durante uma gravidez saudável, de uma mulher celíaca ou não-celíaca, é habitual existirem sintomas digestivos que podem confundir-se com sintomas celíacos. As celíacas podem senti-los e associarem-nos a actividade da doença, mas não estarem realmente relacionados. São exemplos a azia/ardor no estômago, o “refluxo”, o enfartamento, a sensação de digestão arrastada, a “pressão” abdominal, a obstipação, a diarreia, a flatulência ou as cólicas.

Em resumo, quando uma mulher pretende engravidar deve garantir que a DC está controlada para assegurar uma gravidez e período pós-parto saudáveis. Quaisquer queixas durante a gestação devem ser relatadas e avaliadas pelo médico assistente, sabendo-se que numa gravidez saudável podem existir sintomas digestivos banais mas que se podem confundir com a DC. A dieta deve ser rigorosamente isenta de glúten na pré-concepção, durante a gravidez, no pós-parto e, óbvio, ao longo do resto da sua vida!

2019

Sim, é.

A maioria dos celíacos diagnosticados na idade adulta passou um período mais ou menos longo das suas vidas sem qualquer queixa. Tinham, portanto, uma doença assintomática (a tal doença “adormecida”), que, por não causar qualquer sintoma nem se apresentar com nenhum sinal, permaneceu totalmente despercebida. Embora não se saiba exactamente porquê, a certa altura, o indivíduo pode começar a ter queixas, quer do foro intestinal (cólicas, distensão ou diarreia, por exemplo), quer de outros órgãos (como as articulações, o sistema nervoso, a pele ou o sangue). Assim, uma doença celíaca assintomática e, por isso, nunca suspeitada, passa a manifestar-se e surge a oportunidade de se fazer a investigação correcta para se chegar ao diagnóstico final.

Respondendo à questão, na fase em que a DC é assintomática, é possível dela suspeitar caso se realizem as análises dos anticorpos específicos para esta doença. Se forem positivos, dever-se-á realizar endoscopia com biópsia do duodeno, que, se demonstrar atrofia, faz o diagnóstico.

Esta é, muitas vezes, a história da DC nos indivíduos sujeitos a rastreio, nomeadamente por terem um familiar de primeiro grau celíaco (pai, mãe, irmão ou filho): não têm queixas, sempre foram aparentemente saudáveis e apenas porque tal relação familiar aumenta o seu risco de ter DC em cerca de 20% propõem-se a fazer as análises. Porquê? Porque se forem mesmo celíacos, quanto mais cedo souberem e se começarem a tratar, melhor…

Como em qualquer outra doença, há uns celíacos que se apresentam com sintomas e sinais mais graves do que outros. Contudo, na DC não há uma “escala de gravidade” que se possa utilizar para classificar os celíacos. Algumas vezes utilizam-se os termos “DC controlada” ou “DC em remissão”, significando que não há sinais clínicos, laboratoriais nem microscópicos de DC. O inverso será uma “DC activa” ou “descompensada”, quando é possível constatar que a doença tem tido impacto negativo no organismo.

Assim sendo, não faz sentido questionar um celíaco sobre qual o seu “grau ou nível”. Contudo, percebe-se que essa falsa questão poderá relacionar-se com uma escala muito conhecida que se utiliza para classificar as alterações microscópicas da doença, quando se fazem biópsias do intestino delgado – a escala de Marsh. Contudo essa escala, que inclui 6 níveis (de 0 a 3c), serve apenas para isso mesmo: classificar a gravidade das alterações microscópicas observadas naquelas biópsias. Esta classificação não tem necessariamente correlação com a gravidade dos sintomas e, por isso, não serve para classificar clinicamente os celíacos.

Por isto, talvez a melhor resposta seja: “Grau? Nível? Não sei… Isso interessa? O que interessa mesmo é cumprir a dieta e ser um celíaco controlado!”

Após o diagnóstico inicial de Doença Celíaca (DC) e o início rigoroso de uma dieta isenta de glúten, cerca de 90% dos celíacos constatam um rápido alívio nos sintomas e, gradualmente, uma melhoria do seu estado nutricional e das alterações laboratoriais existentes. Se a dieta for mantida de forma disciplinada ao final de 1-2 anos será possível, na grande maioria dos casos, constatar a recuperação do intestino delgado, com o desaparecimento da atrofia das vilosidades e a retoma do seu aspecto normal.

Contudo, passados pelo menos 12 meses do início da dieta, num raro número de pessoas, não se verifica melhora dos sintomas e, adicionalmente, não se observa a recuperação intestinal: persistem a diarreia, a dor abdominal, o emagrecimento, o cansaço, o mal-estar geral, a anemia e as múltiplas deficiências nutricionais (vitaminas e minerais). Neste cenário, em que o celíaco mantém as queixas e se sente mesmo doente, investigadas e excluídas outras causas para o quadro clínico, pode colocar-se a hipótese de se tratar de uma DC refractária. Esta é uma situação pouco frequente (atinge menos de 1% dos celíacos diagnosticados) e surge essencialmente em indivíduos com mais de 50 anos, sendo considerada rara antes dos 30 anos. É importante reconhecer precocemente uma DC refractária porque pode associar-se a situações complexas como o linfoma intestinal.

Mas atenção! Há que distinguir uma verdadeira DC refractária – uma situação pouco frequente e grave – de uma DC persistente por estar mal controlada… Na verdade, a grande maioria dos celíacos que tem sintomas mantidos após 1 ano do diagnóstico e que, na repetição das biópsias, não vê melhorar ou normalizar as alterações microscópicas do intestino delgado têm, simplesmente, incumprimento dietético. Significa que, voluntariamente ou inadvertidamente (por contaminação), entra glúten no organismo, responsável por manter a actividade auto-imune que conduz à DC.

Torna-se assim fundamental manter o seguimento regular recomendado após o diagnóstico inicial da DC. Caso os sintomas persistam 6-12 meses depois de iniciada a dieta isenta de glúten, há que relatar isso ao médico e à dietista assistentes. Não esquecer que as falhas dietéticas são o principal motivo de não melhoria do celíaco! Excluída essa causa, é útil rever novamente todo o processo clínico, pois há outras doenças que podem imitar a DC e cujo diagnóstico diferencial pode ser difícil. O médico assistente, perante algumas dúvidas pode querer investigar um pouco mais e solicitar exames adicionais: pedir umas análises mais específicas, repetir a endoscopia com biópsias do duodeno, requisitar um exame de imagem do abdómen ou efectuar uma observação do intestino delgado por vídeo-cápsula, por exemplo.

Em resumo, a designação “Doença Celíaca Refractária” deve apenas ser utilizada para situações raras e concretas de celíacos que, com pelo menos 12 meses de dieta comprovadamente isenta de glúten, se mantêm doentes, com sintomas importantes e má-absorção intestinal. É importante salientar que a maioria das pessoas inicialmente classificadas como tendo uma “doença celíaca refractária” tem persistência das alterações intestinais apenas por incumprimento dietético…

A maioria poderá, mas a sua introdução na dieta deve ser cautelosa e controlada.

Porque o tema é controverso, o consumo de aveia pelos celíacos tem motivado algum debate ao longo do tempo. Salienta-se, desde já, que a aveia não é alimento obrigatório nem necessário ao celíaco e que o seu consumo é totalmente facultativo. Quem a quer consumir pretende aproveitar o seu conteúdo em fibra e o valor dos seus nutrientes. Claro que, quando aqui se refere “aveia”, tem que ser sempre e necessariamente aveia pura, certificada, isenta de glúten.

As proteínas consideradas tóxicas para os celíacos, genericamente chamadas “glúten”, são aquelas que estão presentes no trigo, cevada e centeio. São essas que, estimulando o sistema imunitário, conduzem à activação da auto-imunidade no celíaco e, assim, aos mecanismos que conduzem à doença e aos seus sinais e sintomas. Considera-se que a aveia, por ter na sua constituição proteínas diferentes dos restantes cereais, poderá não ser, quando comparada com os outros, tão tóxica para o celíaco.

A verdade é que existe uma pequena fracção de celíacos que reage negativamente à ingestão de aveia, levantando-se assim dois problemas adicionais: por um lado, não se consegue prever, entre todos, quais serão aqueles que poderão agravar a sua doença com esse cereal; por outro lado, há que garantir que o tal consumo de aveia não reactiva a doença, colocando assim em causa todo o esforço dedicado ao cumprimento adequado de uma dieta isenta de glúten.

Desta forma, a ingestão de aveia por um celíaco deve ser decididamente cautelosa e devidamente acompanhada pelo médico e nutricionista. Imediatamente após o diagnóstico inicial da doença, deve-se aprender a cumprir uma dieta rigorosa isenta de glúten e, nesta fase, a aveia deve também ser eliminada. O objectivo é aguardar pela recuperação do organismo, com o desaparecimento dos sintomas intestinais e, caso existam, dos sintomas relacionados com outras doenças associadas (da tiróide, da pele ou articulares, por exemplo). Progressivamente assiste-se a uma normalização das alterações laboratoriais, como as deficiências vitamínicas ou a anemia. É de esperar que, na grande maioria dos celíacos que tinham anticorpos específicos para a doença positivos (nomeadamente os anti-transglutaminase tecidular), estes se tornem negativos. É também expectável que o intestino delgado recupere da sua inflamação crónica e da atrofia das suas vilosidades. Esta reparação intestinal, especialmente no adulto e variando de caso para caso, deve ser comprovada com uma nova endoscopia com biópsias do duodeno.

Este processo de recuperação do organismo pode levar tempo (anos) e apenas se considera que o celíaco está controlado quando a dieta é cumprida, não tem sintomas e tem as análises de sangue e biópsias do duodeno normais. É nessa altura que se poderá considerar a hipótese de introduzir a aveia na alimentação caso, obviamente, seja esse o desejo do indivíduo. Isso deve ser feito com o devido acompanhamento médico/nutricional, pois há que ter alguns cuidados:

Ingerir diariamente, e durante um período de tempo pré-estabelecido, uma determinada quantidade de aveia certificada; Registar quaisquer sintomas ou sinais novos que possam surgir e relacionar-se com esse consumo; Realizar uma reavaliação médica após o tal período pré-estabelecido de “experiência”. Nesta altura é adequado repetir as análises e/ou a endoscopia com biópsias. O objectivo é garantir que, nesse indivíduo, o consumo de aveia não despertou a doença celíaca novamente. Em resumo, após o diagnóstico inicial de doença celíaca a aveia (tal como o trigo, centeio e cevada) deve ser eliminada da dieta. Deve-se aguardar a recuperação total do organismo e a confirmação médica de que a doença está controlada. Só então se pode introduzir a aveia na alimentação, caso se pretenda e sob vigilância clínica e de nutricionista. É depois obrigatória a confirmação de que o celíaco é tolerante à aveia e que esta não lhe é prejudicial.

2018

Não!

O desenvolvimento do conhecimento científico sobre a doença celíaca (DC), nas últimas décadas, permitiu aos médicos conhecer melhor os mecanismos que levam ao seu aparecimento, identificar mais criteriosamente os sintomas (intestinais e extraintestinais) e ter à sua disposição testes diagnósticos sensíveis e específicos para ajudar no diagnóstico – anticorpos e estudos genéticos no sangue e análise microscópica das biópsias intestinais. Este progresso científico, a par de uma maior consciencialização da população geral, levou a um aumento do número de casos diagnosticados, reconhecendo-se que a aposta clínica deve ser feita no diagnóstico precoce, associado a menor taxa de complicações e de doenças concomitantes ao longo da vida.

Nos últimos 5 anos, temos todos sido testemunhas da importância do fenómeno “sem glúten” na indústria alimentar e no mercado. Para essa verdadeira explosão no consumo de produtos isentos de glúten, contribuem não só causas estritamente médicas (como a doença celíaca ou a intolerância ao glúten não-celíaca) mas essencialmente o facto de ser “uma moda”, “ser mais saudável” ou, simplesmente, ser “uma mania” de muitos. O negócio dos produtos sem glúten é, actualmente e em todo o mundo ocidental, um mercado muito apetecível pelo grande número de consumidores potenciais e pela sua rentabilidade económica. E isso não é necessariamente mau para o celíaco, aquele que verdadeiramente tem que cumprir uma dieta isenta de glúten: a DC ganha visibilidade e ergue a sua voz, há mais oferta nos restaurantes e supermercados, existe maior variedade de marcas e produtos e, porventura, a concorrência permite estabilizar os preços de venda ao público.

Apesar de toda esta dinâmica em torno da DC, no campo terapêutico, o único tratamento actualmente disponível é o cumprimento rigoroso de uma dieta isenta de glúten. A ínfima quantidade de glúten ingerida, propositada ou inadvertidamente, pode estimular o sistema imunitário e produzir efeitos nefastos sobre o organismo.

Em paralelo com a popularidade e o entusiasmo que actualmente observamos com as dietas isentas de glúten, têm aparecido no mercado produtos vários que se publicitam como uma ajuda no cumprimento da dieta, em especial na presença de alimentos declaradamente com glúten ou suspeitos de contaminação. Têm na sua composição enzimas digestivas (proteases) e/ou probióticos (micro-organismos que compõem e influenciam a flora intestinal)  e são promovidos comercialmente como substâncias que beneficiam os intolerantes ao glúten e os celíacos, facilitando o seu dia-a-dia. Estes produtos não devem ser consumidos, nem como substitutos da dieta isenta de glúten nem para tratar uma contaminação inadvertida. Não há qualquer recomendação médica para a sua utilização em qualquer circunstância.

Os celíacos devem estar atentos e munidos de toda a informação relevante para que possam facilmente rejeitar estas “propostas” que, previsivelmente, vão cada vez mais estar disponíveis no mercado.

  • Estes produtos não são medicamentos – são vendidos como suplementos alimentares em lojas físicas e on-line, com formas de apresentação doseadas semelhantes aos medicamentos (cápsulas, comprimidos, saquetas). Como por lei não podem mencionar propriedades profiláticas, de tratamento ou cura de doenças ou seus sintomas, recorrem muitas vezes nas suas publicidades a frases vagas e pouco explícitas, como “ajuda na digestão do glúten” ou “para utilizar se for comer glúten”. Outras vezes, são publicitados para “intolerantes ao glúten” sem menção directa à doença celíaca, podendo induzir em erro quem lê a sua rotulagem.
  • Não há nenhum destes produtos que tenha sido recomendado ou aprovado por nenhum grupo de estudos nem de especialistas em DC nem por nenhum organismo ou autoridade mundial reguladora de medicamentos. Pelo contrário, os especialistas têm-se mostrado muito preocupados com a proliferação destes compostos, que podem ser muito prejudiciais aos celíacos que as consumam e que nelas sintam alguma segurança (falsa) e assim reduzam o seu grau de alerta contra os alimentos com glúten.
  • Os probióticos têm sido extensamente estudados em várias situações clínicas, mas na DC não têm demonstração científica do seu benefício. Em laboratório há estudos que revelam diminuir a resposta inflamatória da parede intestinal, diminuir a permeabilidade intestinal, fortalecer a camada de muco protectora e produzir enzimas digestivas. Contudo, actualmente, não há evidência clínica de que os probióticos possam ser benéficos na DC e, por isso, não há recomendações para que um celíaco os tome (independentemente de qual probiótico, que mistura de bactérias e que doses). Adicionalmente, de forma preocupante, já foram encontrados vestígios de glúten em probióticos comercializados.
  • Os enzimas digestivos para a digestão do glúten (proteases) têm sido estudados em laboratório, não se tendo demonstrado qualquer benefício clínico na DC. A sua utilização é limitada por dois factores, até agora difíceis de contornar: têm que ser resistentes ao ácido gástrico e têm que inactivar todo o glúten ingerido antes que o bolo alimentar passe para o intestino delgado. É especialmente perigoso para a saúde de um celíaco que se pense que se trata uma contaminação ou uma ingestão voluntária de glúten com estes produtos.

Porque se anseia muito pela cura ou por um medicamento realmente eficaz na DC, logo que haja evidência científica que apoie uma qualquer nova terapêutica, seguramente as sociedades médicas não pouparão esforços para a sua aprovação, comercialização e divulgação. Essa informação não escapará ao radar de um celíaco. Até lá, reafirma-se que o único tratamento eficaz para a doença celíaca é a dieta isenta de glúten, rigorosa e mantida ao longo do tempo.

Não, não pode!

A dieta isenta de glúten (DIG) deve ser rigorosamente cumprida desde o momento do diagnóstico. O glúten tem a capacidade de estimular o sistema imunitário, o que se traduz primariamente na destruição das vilosidades intestinais e consequente má absorção de nutrientes, vitaminas e minerais. Embora quando se inicie a DIG o celíaco note melhoria rápida dos sintomas gastro-intestinais, é a manutenção dessa dieta que assegura a recuperação total do intestino e o desaparecimento dos sintomas relacionados com o glúten, para além de evitar o aparecimento de outras situações auto-imunes associadas à doença celíaca (tiroidite, artrite ou dermite, por exemplo). Quando um celíaco controlado (sem sintomas, sem alterações laboratoriais e com biópsias do duodeno já normais) começa a desleixar a sua dieta pode verificar que nada sente quando consome esporadicamente glúten. Na verdade, há celíacos muito sensíveis ao glúten e que, com uma quantidade mínima (mesmo como contaminante), têm sintomas variados que anunciam essa ingestão, reforçando assim a sua necessidade de ter uma DIG rigorosa. Contudo, o grupo dos celíacos que nada sente quando consome glúten torna-se o grupo mais “perigoso”: comem glúten voluntariamente ao longo do tempo e continuam a sentir-se bem e porventura, esquecem o acompanhamento médico e nutricional… Mas o seu sistema imunitário está activado de forma silenciosa, mantendo algum grau de destruição intestinal e aumentando o risco, ao longo do tempo, de complicações associadas à doença celíaca. Estes celíacos pouco exigentes na sua dieta, apesar de se sentirem bem e terem análises normais, têm biópsias do duodeno que confirmam que existe lesão das vilosidades intestinais. Assim, para evitar uma progressão silenciosa da doença celíaca é necessário manter permanentemente uma DIG, sabendo que uma quantidade mínima de glúten pode ser prejudicial. Relembra-se que a dieta isenta de glúten tem duas vertentes: ou se cumpre ou não se cumpre. Não há meio termo…

É possível, sim.

Quando um celíaco é diagnosticado recomenda-se o rastreio, em análises de sangue, de algumas deficiências nutricionais, comuns nestas situações. É frequente encontrar níveis baixos de ferro, ácido fólico (vitamina B9), vitamina B12, vitamina D, zinco e magnésio. Podem ainda ser aparentes outras deficiências que, regra geral, se relacionam com a gravidade sintomática da doença: proteínas, lípidos, hidratos de carbono, outras vitaminas (A, E, K ou do complexo B, por exemplo) e de outros minerais (cálcio ou fósforo, nomeadamente). Qualquer uma destas deficiências detectadas no sangue pode traduzir-se em variados sintomas ou sinais no celíaco. Por exemplo, as deficiências de ferro ou de ácido fólico podem originar anemia, a de vitamina D pode favorecer a osteoporose, a de vitamina B12 pode ser causa de sintomas neurológicos variados bem como de anemia e a de zinco retardar o crescimento e desenvolvimento na criança.

O início da DIG permite a recuperação gradual do intestino delgado, o restaurar da capacidade de absorção e da normalização das deficiências aquando da data de diagnóstico. Contudo, esta normalização pode ser lenta e depende de vários factores: do estado de gravidade inicial da doença, do rigoroso cumprimento da dieta (há sempre um período de aprendizagem) e do aporte na dieta dos nutrientes em falta. Na verdade, na maioria dos casos, 1 ano depois de iniciada a restrição de glúten é de esperar essa normalização. Quando isso não se verifica, em primeiro lugar, há que manter a suspeita de que a DIG não está a ser cumprida, quer voluntariamente quer porque existe contaminação. O celíaco deve recorrer a um Nutricionista com experiência na DC e deve ser feita uma revisão sistemática do diário nutricional, garantindo a restrição de glúten.

Mas, apesar do cumprimento da dieta e mesmo demonstrando-se a total recuperação intestinal (repetindo a endoscopia alta com biopsias do duodeno) podem persistir algumas deficiências nutricionais. Nesse caso, há que assegurar que a DIG é equilibrada e que não é uma dieta pobre em determinadas vitaminas ou minerais. Por outro lado, um organismo ainda em recuperação pode exigir uma quantidade diária de determinados nutrientes superior ao habitual. Assim sendo, o Médico pode considerar adequada a suplementação oral que é feita, geralmente, sob a forma de comprimidos ou cápsulas.

Não! Não se deixa de ser celíaco…

A doença celíaca (DC) é uma situação auto-imune que não se espera que resolva com o passar do tempo, com a idade ou com fases da vida, como a adolescência ou a menopausa. O diagnóstico de um celíaco tem que ser feito com rigor. Para isso, recolhem-se informações acerca de eventuais sintomas e sinais, a análises do sangue (nomeadamente aos anticorpos específicos da doença e à genética) e aos resultados da endoscopia com biópsias do duodeno (mostrando atrofia). Caso seja tudo compatível, pode-se afirmar a DC com um elevado grau de certeza: a dieta isenta de glúten deve ser imediatamente instituída e mantida para o resto da vida. Só essa dieta rigorosa e mantida poderá evitar o reaparecimento das queixas associadas à DC, impedir a instalação de outras doenças auto-imunes e evitar complicações irreversíveis.

Existem casos de pessoas que asseguram que “deixaram de ser celíacas”… na verdade esses indivíduos nunca terão sido celíacos e o diagnóstico terá sido feito sem grande suporte científico ou com base em exames pouco fiáveis ou com resultados incompletos. Contudo, ao iniciar uma dieta isenta de glúten, sentiram-se bem melhor – por coincidência ou porque têm alguma hipersensibilidade ao glúten não celíaca – e, por isso, foram classificados como “celíacos”. Mais tarde, terão voltado a ingerir de glúten sem aparente problema e, ao repetir os exames médicos… não há sinais de DC! Mas não deixaram se ser celíacos: a verdadeira questão é que nunca o foram.

Até que a ciência evolua para novas abordagens, um celíaco diagnosticado sê-lo-á para o resto da vida e deve cumprir sempre uma dieta rigorosa. Contudo, há boas perspectivas. Estão em curso investigações na área da imunologia no sentido de permitir ao sistema imunitário do celíaco “aprender” a tolerar glúten, não reagindo de forma a destruir as células do intestino delgado. Até lá, dieta isenta de glúten!

Sim, é verdade.

Podem-se passar anos até que o diagnóstico seja feito, já na idade adulta. Isto é especialmente verdade nos casos em que as queixas são mínimas, ligeiras ou inaparentes. São exemplos as pessoas com anemia por carência de ferro ou de ácido fólico, os indivíduos apenas com flatulência e cólicas abdominais ou aqueles com cansaço ou fadiga crónica e inexplicável. São geralmente sintomas que toleram ao longo do tempo e com os quais vão vivendo. Alguns estudos referem que, entre os primeiros sintomas, o consultar o médico e, finalmente, o ter o diagnóstico, o atraso médio é de 9 anos!

Assim, um diagnóstico tardio, no qual o sistema imunitário esteve “activado” durante um período longo, associa-se a maior probabilidade de situações irreversíveis concomitantes (como a osteoporose), de aparecimento outras doenças auto-imunes (como a tiroidite) e, eventualmente, de uma frequência aumentada de alguns tumores (do intestino delgado, por exemplo). Por esses motivos, na presença de suspeita clínica ou de pessoas assintomáticas com indicação para rastreio da DC (por exemplo, nos familiares de primeiro grau de celíacos) deve ser planeada uma estratégia de diagnóstico que se revele eficaz e rápida.

2017

A doença celíaca nem sempre é fácil de diagnosticar. Nos casos em que tudo encaixa bem e o puzzle se compõe, o diagnóstico pode ser muito linear: alguém que tem queixas típicas (diarreia, dor e distensão abdominal e emagrecimento), com análises sugestivas (sinais laboratoriais de má absorção), serologia positiva (nomeadamente anticorpos anti-transglutaminase IgA elevados) e biópsias duodenais mostrando atrofia. Contudo, são cada vez mais frequentes os casos de adultos que se queixam, sem dúvida, de sintomas relacionados com a ingestão de glúten e que recorrem a uma consulta médica para investigação e que, após investigação completa, não é possível estabelecer o diagnóstico de doença celíaca. São pessoas geralmente com predisposição genética (genes positivos), sem alterações nas análises sanguíneas e com anticorpos negativos. As suas biópsias duodenais não são conclusivas porque não mostram inequivocamente atrofia (que é necessária para o diagnóstico de um celíaco) mas também não são totalmente normais (por terem linfócitos entre as células intestinais)… Como estes indivíduos se queixam repetidamente de sintomas quando ingerem glúten, acabam por fazer uma dieta dele isenta pois é assim que se sentem melhor. Podemos especular que pessoas com estas características têm “hipersensibilidade ao glúten não celíaca” – uma nova doença, ainda pouco estudada, sem critérios diagnósticos definidos mas também relacionada com os cereais (com o glúten ou com outras proteínas dos cereais, ainda não caracterizadas). Até que o conhecimento científico nos revele mais, estes indivíduos – com sintomas relacionados com o glúten mas sem diagnóstico de doença celíaca – devem cumprir a dieta com a qual se sentem melhor, mantendo ainda uma vigilância médica regular.

Atenção…

A doença celíaca, sendo uma doença que causa má absorção intestinal, pode cursar com deficiências nutricionais. Faz parte da investigação inicial – no momento do diagnóstico – e da rotina – ao longo do tempo – o pedido de um conjunto de análises de sangue que se destinam a investigar se há alguma deficiência que deva ser suplementada. Assim, alguns celíacos orientados pelo seu médico e após realizar alguns exames beneficiarão realmente de suplementos vitamínicos e minerais (como, por exemplo, cálcio, ferro, vitamina B12 ou ácido fólico). Esses suplementos deverão ser prescritos na consulta e ser especificamente livres de glúten. Não esquecer que nunca deverão ser utilizados como substituição de uma dieta saudável, equilibrada e adequada.

Os produtos à base de proteínas (batidos), actualmente tão aconselhados na prática do exercício físico, têm que ser utilizados com cuidado e, a primeira questão a colocar é acerca da sua real vantagem para o tipo de treino e face ao objectivo que se tem com essa prática. Seguidamente, há que considerar que os produtos a consumir: a) têm de estar especificamente rotulados como livres de glúten; b) têm geralmente substâncias acrescentadas para dar paladar, como edulcorantes ou açúcares artificiais (nomeadamente sorbitol ou aspartame) que, por si só, são causadores de alguns sintomas gastrointestinais; c) podem ter na sua composição outros componentes porventura lesivos ou tóxicos para outros órgãos como o fígado ou o rim. Não esquecer que é possível, no contexto da prática desportiva e de ginásio, cumprir uma dieta reforçada em proteínas utilizando alimentos comuns… E que há, como exemplo, receitas variadas para desportistas, como por exemplo barras energéticas (com reforço de carbo-hidratos e proteínas) que se podem fazer em casa com toda a segurança com alimentos naturalmente isentos de glúten.

Ainda não…

A doença celíaca (DC) trata-se cumprindo uma dieta totalmente isenta de glúten. No entanto, existem algumas linhas de investigação envolvendo terapêuticas variadas, nomeadamente uma vacina. Note-se que, em rigor, o termo «vacina» deve apenas ser aplicado aos tratamentos preventivos de doenças infecciosas, mas a sua utilização tem sido vulgarizada quando se discute a DC.

Quando um celíaco ingere glúten (o agente agressor), os seus linfócitos (células imunitárias) reagem de forma determinada, tendo em vista a sua neutralização. A resposta imunitária e de defesa contra o glúten torna-se desregulada e desproporcionada, com reações autoimunes conduzindo à progressiva destruição das células do intestino delgado e de outros órgãos também envolvidos na DC. Com a persistência do consumo de glúten, mantém-se o ciclo da inflamação e observa-se o desaparecimento gradual das vilosidades, má absorção dos alimentos ingeridos e, ao mesmo tempo, aparecimento dos sinais e sintomas conhecidos da doença.

A vacina, tal como está em desenvolvimento, pretende ensinar ao sistema imunitário uma forma de tolerar o glúten ingerido e, assim, evitar as reações que conduzem à destruição da parede intestinal e de outros órgãos envolvidos na DC. A estratégia atualmente em desenvolvimento assemelha-se àquela utilizada nas doenças alérgicas, como nas alergias aos ácaros, aos pólenes ou aos pêlos de gato (que podem causar rinite, sinusite ou asma, por exemplo). Pretende-se «dessensibilizar» (passagem de um indivíduo sensível a determinado produto a «insensível»), estimulando progressivamente o sistema imunitário com doses crescentes desses agentes agressores. Assim, naturalmente e ao longo do tempo, o organismo aprende a suportá-los, tornando-se-lhes tolerante.

Os estudos para a vacina da DC têm sido efetuados em celíacos DQ2 positivos (o gene mais frequente). Foram injetados de forma subcutânea (debaixo da pele, como a insulina dos diabéticos) um composto de três proteínas constituintes do glúten e que se consideram ser os principais agressores e desencadeantes da resposta das células imunitárias. A investigação terminou, já este ano, a fase em que se estudaram, com administração de doses variadas, a segurança, a tolerância e o mecanismo de ação do produto. Após aplicar a injeção a um número relativamente pequeno de pessoas, colheram-se amostras de sangue e de outros fluídos para análises e estudaram-se os efeitos no organismo. Como os resultados foram animadores, a fase seguinte, programada ainda para 2017, determinará se este produto tem realmente eficácia clínica, quais os efeitos secundários e a sua atividade biológica. Este passo vai ser crucial para concluir se poderá ser mesmo útil aos celíacos.

Pensa-se que o maior interesse dessa vacina seja ajudar a recuperação dos celíacos sob dieta e, numa perspetiva mais avançada, permitir aos celíacos a opção em segurança por uma dieta com glúten. O tratamento, embora ainda não definido, terá uma primeira fase (chamada fase de indução) na qual as injeções serão mais frequentes, de doses mais pequenas e monitorizadas pelo médico. Posteriormente, na fase de manutenção, será possível utilizar doses maiores, espaçar as injeções e até permitir que seja o celíaco a fazê-las, em casa.

Sabemos que as etapas de investigação de um fármaco têm múltiplos obstáculos a ultrapassar e que apenas uma percentagem pequena dos medicamentos em estudo acaba por ser comercializada. Contudo, os desenvolvimentos científicos nos últimos tempos devem trazer ânimo e são razões válidas para manter alta a expectativa. Até lá (e nunca antes de cinco anos…), cumprir uma dieta isenta de glúten é o melhor – e único – conselho!

Muitos celíacos contam que o mais difícil foi mesmo chegar até ao diagnóstico. A partir dessa altura, a manutenção de uma dieta isenta de glúten permitirá a recuperação intestinal, a remissão das queixas e a restituição da sua qualidade de vida. Uma vez diagnosticada a DC, torna-se importante:

  • Aprender sobre a DC, recorrendo sempre a fontes de informação cientificamente fiáveis. Cada celíaco deve estar capacitado para ser o melhor veículo de informação e de divulgação no seu círculo de amigos e familiares.
  • Controlar a sua dieta com segurança. Para isso há que aprender a escolher os alimentos (conhecer os proibidos, os perigosos e os permitidos) e a interpretar correctamente os rótulos das embalagens, extraindo daí a informação vital. A manipulação dos alimentos e o cozinhar sem glúten não deverão representar problemas e, para o facilitar, existem truques e dicas ensinados em encontros e workshops organizados para o efeito.
  • Manter a sua vida e rotinas habituais, adaptando-as a um estilo de vida gluten free. Não é de esperar qualquer constrangimento ou limitação no plano familiar, social, académico ou profissional: deve continuar a comer fora, a divertir-se com os seus amigos, a frequentar as casas de familiares e a viajar. Existem certamente «momentos difíceis» no cumprimento da dieta isenta de glúten, de provação ou de tentação, que se aprendem a gerir eficazmente. A passagem do tempo e a experiência individual seguramente vão ajudar.
  • Aderir à vigilância médica e ao acompanhamento dietético com a periodicidade que lhe for recomendada, de acordo com o seu caso específico. Alguns celíacos precisarão, nos primeiros tempos, de apoio médico mais intensivo e regular, devido à sua idade, ao maior impacto da DC no organismo ou à presença de doenças associadas.

Muito frequentemente ouvimos indivíduos a relatar queixas de distensão (ou inchaço) abdominal, de sensação de gases, de flatulência e de cólicas abdominais, por vezes acompanhadas de gorgolejo (ruídos no abdómen). Essas pessoas podem não ter qualquer alteração do trânsito intestinal ou, então, até contarem ter diarreia ou obstipação. Alguns desses indivíduos já perceberam que uma dieta isenta ou «com menos» glúten os faz sentir melhor. Claro que, quando a conversa é tida com um celíaco (ou com um médico…), percebe-se onde se quer chegar: “será que também sou celíaco?” Vejamos:

  • Todos os sintomas referidos acima são inespecíficos da DC e muito frequentes na prática clínica. Não são sintomas que, isoladamente, façam imediatamente apontar para a DC e, na verdade, a maior probabilidade é de se tratar de uma outra doença que se pode manifestar desta forma, tal como a síndrome do cólon irritável ou a intolerância à lactose.
  • Não é apenas por se verificar uma relação entre ingerir menos glúten e ficar melhor que se faz o diagnóstico de DC. Ao diminuir o volume de glúten ingerido, reduz-se frequentemente a carga de fibra da dieta (entre outros componentes) e isso, por si só, poderá ter um impacto positivo nas queixas apresentadas. Embora isto isoladamente não permita fazer o diagnóstico de DC, o seu médico assistente terá todo o interesse em saber dessa associação.
  • Não deve ser iniciada uma dieta isenta de glúten antes de se consultar um médico e de fazer o estudo adequado. O cumprimento de tal dieta por um indivíduo não celíaco nunca representa, por si só, um risco para a sua saúde desde que esta seja equilibrada e racional, como qualquer outra opção nutricional o deve ser. Contudo, é importante salientar que algumas semanas de dieta isenta glúten poderão comprometer os resultados dos exames complementares e assim adiar-se ou perder-se a oportunidade de um diagnóstico preciso da situação.

Assim sendo, os indivíduos que têm queixas e cuja experiência alimentar os coloca na dúvida de serem ou não celíacos devem ser encaminhados para o seu médico e não devem iniciar dieta isenta de glúten antes de ser feito o estudo clínico adequado. Só assim se poderá chegar ao diagnóstico acertado.

2016

Depois de feito o diagnóstico de doença celíaca, a dieta isenta de glúten deve ser mantida de forma rigorosa e durante a vida toda (ou até que novas descobertas científicas alterem este conselho!). Além disso, o celíaco deve aderir a um plano de vigilância regular, tal como em qualquer outra doença crónica, como a asma, hipertensão arterial ou diabetes.

Ao longo do tempo, o seu médico vai perceber, conversando e observando-o na consulta, que a doença está controlada e que não há sintomas nem sinais de nenhuma complicação. Deve realizar, rotineiramente, algumas análises de sangue para confirmar, entre outros, se existe alguma anemia, deficiência vitamínica ou de oligo-elementos (como ferro, ácido fólico, vitaminas B12 e D, cálcio) ou alterações do fígado, da tiróide ou das proteínas. Na maioria dos celíacos, é também útil dosear no sangue os anticorpos específicos da DC (como o anti-transglutaminase tissular IgA). O seu médico pode sugerir repetir a endoscopia com biópsia do duodeno, para confirmar a boa recuperação das vilosidades intestinais, atrofiadas pela inflamação causada pela ingestão de glúten. Esta endoscopia de controlo é pedida, geralmente, não antes de 1-2 anos de dieta bem cumprida, pois o regresso à normalidade do intestino delgado pode ser lento. Existem mais exames complementares que podem ser úteis no contexto de uma DC, mas terão de ser ajustados ao caso concreto de um indivíduo.

Além da consulta médica de rotina, não se deve esquecer o regular acompanhamento por um nutricionista com experiência no tema. Só assim pode assegurar que a sua dieta está, além de efectivamente restrita de glúten e livre de contaminações, equilibrada no que respeita a calorias e aos múltiplos nutrientes necessários a uma alimentação saudável.

Não, não pode!

A dermite herpetiforme (DH) é uma outra doença de intolerância ao glúten, cujas manifestações surgem na pele. É uma doença autoimune que pode surgir associada ou não à doença celíaca. É, portanto, uma doença com a mesma «origem», mas diferente da doença celíaca.

Habitualmente nota-se que a pele fica ligeiramente mais vermelha do que o habitual e com umas vesículas (bolhas) muito pequenas, que dão muita comichão e que rebentam facilmente ao coçar, libertando um líquido que lá têm dentro – por parecerem herpes (doença causada por um vírus), dá-se-lhe o nome de «herpetiforme». Estas alterações aparecem de forma simétrica (num lado e noutro do corpo), especialmente nos cotovelos, joelhos, costas, ombros, nádegas, nuca e couro cabeludo. Quando os dermatologistas observam estas alterações, podem optar por fazer uma biópsia das lesões, que geralmente confirma o diagnóstico. Como é uma doença de pele causada pela ingestão de glúten, o tratamento de longo prazo consiste na dieta isenta de tal substância.

Quando se faz o diagnóstico de DH é obrigatório investigar a presença simultânea de doença celíaca, mesmo que não exista qualquer queixa intestinal — cerca de 80% dos indivíduos com essa dermite são, em simultâneo, celíacos! É fundamental que essa investigação seja feita antes de excluir o glúten da dieta, para que os resultados não sejam falseados.

Como a DH é uma doença crónica, e apesar de existirem alguns medicamentos que se podem utilizar para a controlar (ex.: dapsona), o tratamento a longo prazo implica a isenção rigorosa de glúten da dieta. Só assim se reduzem as recidivas da dermatite e a necessidade de medicação e se controla a doença celíaca, se esta estiver simultaneamente presente. Cumprir a dieta com rigor pode ainda reduzir o risco de aparecimento de outras doenças autoimunes.

Em conclusão, embora a DH não seja sinónimo de doença celíaca (há cerca de 20% de pessoas com dermite que não são celíacas), o tratamento de longo prazo é a dieta sem glúten!

Não. Tolerância ZERO. A quantidade mínima que pode comer é… nenhuma!

Depois do diagnóstico da doença celíaca, a dieta isenta de glúten deve ser rigorosamente mantida ao longo do tempo. Sabe-se que uma ínfima porção de glúten pode ser suficiente para despertar a reação do sistema imunitário, originando uma cascata de acontecimentos que leva à destruição das vilosidades e ao aparecimento de sintomas digestivos e noutros órgãos. Esta estimulação imunitária, na maioria dos celíacos, não causa sintomas de imediato, podendo demorar dias ou semanas até se manifestar, por vezes de forma intensa – na verdade, não é como uma reação alérgica imediata a uma picada de abelha (inchaço da face, comichão e vermelhidão no corpo e dificuldade em respirar, por exemplo) nem como uma alergia alimentar em que alimentos (amendoins, morangos, marisco…) causam sintomas rapidamente depois de serem ingeridos. Porque a ingestão ocasional de glúten habitualmente não causa sintomas (mas ativa o sistema imunitário) e porque esses sintomas podem só aparecer mais tarde, alguns celíacos sentem-se tentados a quebrar as suas regras dietéticas, ingerindo voluntariamente glúten ou reduzindo a atenção e o alerta perante alimentos suspeitos. Mas isso é totalmente errado e perigoso, pois qualquer mínima quantidade de glúten pode ser prejudicial.

Nunca pensar que se controla a dieta isenta de glúten com base na ideia de que “posso comer glúten pois não me dá queixas” ou de que “se ingerir glúten, eu sinto”! Um celíaco não pode mesmo ingerir glúten, nem basear-se em quaisquer sintomas para ir controlando a sua dieta: tolerância zero!

Não necessariamente, mas…

Desde o momento do diagnóstico é fundamental que se cumpra rigorosamente a dieta isenta de glúten. Só assim se poderá assegurar a total recuperação intestinal e esperar uma vida sem as complicações de uma doença de longo curso.

Contudo, há doenças vulgares do foro digestivo que se manifestam com sintomas semelhantes aos da doença celíaca. Na verdade, se um celíaco tem esses sintomas (como as cólicas, a flatulência e alterações ocasionais do trânsito intestinal), isso não significa obrigatoriamente que a sua doença está descompensada. Podem apenas ser queixas associadas, por exemplo, aosíndroma do intestino irritável ou a uma intolerância à lactose, patologias muito frequentes na população geral e, por isso, igualmente frequentes no celíaco.

Mas, na verdade, esses mesmos sintomas podem denunciar algum incumprimento dietético… Podem ser as primeiras queixas a denunciar uma ingestão voluntária ou involuntária (contaminação) de glúten. Assim, se um celíaco até agora sem sintomas (isto é, com a doença controlada) começar a sentir novas queixas, é importante que seja feita uma revisão da sua situação clínica.

Essa revisão, realizada pelo seu médico e dietista assistentes, deve perceber, através da história clínica, observação e eventualmente recorrendo a alguns exames complementares de diagnóstico, se as queixas realmente são “celíacas” ou se estão relacionadas com outra qualquer doença gastrointestinal, que interessa diagnosticar para poder tratar.

É ainda um tema controverso, mas admite-se que seja seguro o consumo de aveia na maioria dos celíacos… Mas garantindo obrigatoriamente algumas condições!

Chama-se genericamente «glúten» às proteínas das sementes dos cereais insolúveis em água. Essas proteínas são essencialmente de dois tipos: prolaminas e gluteninas. As prolaminas das sementes de trigo, cevada e centeio, quando ingeridas, são tóxicas para os celíacos. Na verdade, as prolaminas dos vários cereais são diferentes, na sua constituição – pode dizer-se que o glúten do trigo é diferente do glúten da cevada ou do centeio. Contudo, sabemos que qualquer um desses três «glútens» é muito prejudicial a um celíaco.

A aveia tem também o seu tipo especial de glúten, diferente do dos outros cereais. Comparando com o trigo, centeio e cevada, na aveia, a quantidade de glúten é menor e tem uma composição química diferente, que se considera menos tóxica ou mesmo segura para o celíaco.

Embora este tema seja ainda debatido, a evidência científica atual admite que, para a maioria dos celíacos, seja seguro consumir aveia. De qualquer forma, esse consumo só deve ser feito de acordo com a opinião e supervisão do médico e dietista assistentes: uma percentagem pequena dos celíacos reage imunologicamente à aveia, que neles é tão prejudicial quanto os cereais tóxicos habituais.

Assim, a estratégia para um celíaco que não consome e que admite agora vir a consumir aveia passa pelos três tópicos seguintes:

  • Pergunta: Quer mesmo ingerir aveia? Na verdade, não é, culturalmente, um cereal que se consuma com frequência entre nós. Mas sabemos que a aveia tem um bom valor nutricional e que o seu consumo aumenta significativamente o aporte de fibra, tão necessário por vezes para controlar o trânsito intestinal. Insiste nisso? Será necessário?
  • Informação: Caso a resposta seja «Sim, quero!», torna-se fundamental saber e relembrar que só poderá utilizar aveia certificada, ou seja, comprovadamente livre de qualquer contaminação por outros cereais tóxicos (durante o cultivo ou processamento industrial). Reforça-se que a certificação gluten-free na aveia significa assegurar que não tem contaminação de glúten do trigo, cevada ou centeio – na verdade, tem o tal glúten da aveia, potencialmente não tóxico para o celíaco.
  • Decisão: Caso pretenda introduzir a aveia na sua dieta regular, tem de fazê-lo sob supervisão do seu dietista e médico assistente. Genericamente, é necessário:
    • Assegurar inicialmente a remissão da doença celíaca (para ter a certeza de que está tudo controlado, antes de introduzir a aveia);
    • Ingerir diariamente, e durante um período de tempo pré-estabelecido, uma determinada quantidade de aveia certificada;
    • Anotar quaisquer sintomas ou sinais novos que possam surgir e relacionar-se com esse consumo, sabendo que algumas queixas gastrointestinais podem apenas ter relação com o aumento da fibra na dieta;
    • Reavaliar obrigatoriamente a estabilidade da doença celíaca depois do período estipulado de consumo de aveia: caso haja sinais de que voltou a existir inflamação no intestino delgado, não deverá mais consumir aveia… Quer esta avaliação final, quer a inicial serão feitas conforme as indicações do seu médico assistente, variando de acordo com o indivíduo e as características da sua doença – são para isso utilizadas análises sanguíneas e endoscopia com biópsia duodenal.

Em conclusão, se for um celíaco com a doença controlada, cumpridor da sua dieta e caso queira mesmo consumir aveia certificada, poderá experimentar fazê-lo sob supervisão médica. Se então se comprovar que a aveia é inócua para si, poderá consumi-la sem problema.

2015

A DC é uma doença que apenas surge em indivíduos geneticamente susceptíveis, ou seja, que são positivos para os genes que lhe estão associados: DQ2 ou DQ8. Isto significa que, se o gene existe na família, existe uma maior probabilidade de surgirem familiares celíacos. Calcula-se que a probabilidade de um familiar de primeiro grau de um celíaco (pai, mãe, irmãos ou filhos) ter também doença celíaca é de cerca de 10%.

Para estes 10 % de probabilidade de um celíaco ter um filho também intolerante ao glúten, não contam unicamente a existência dos genes DQ2 ou DQ8, embora saibamos que a sua presença é obrigatória para que se seja celíaco. Existem outros fatores que se relacionam com o aparecimento da DC, nomeadamente alguns ligados ao ambiente, à exposição do indivíduo a infeções virais, à flora intestinal, à amamentação enquanto criança e à idade de introdução do glúten na dieta.

Assim sendo, sendo celíaca, o pediatra dos seus filhos deverá desde logo sabê-lo. Só assim poderá aconselhá-la corretamente ao longo do tempo.

No momento do diagnóstico de DC os anticorpos transglutaminase tissular IgA (TTG-IgA) são positivos em cerca de 90% dos casos. Quando se inicia a dieta isenta de glúten, a maioria desses celíacos normaliza os valores dos anticorpos. Quando, ao longo da vida, se observa novamente a sua subida (ou seja, voltam a estar positivos) isso significa quase sempre que a dieta não está a ser cumprida…

Vale então a pena recorrer ao seu médico assistente e consultar a dietista que o acompanha, para rever o caso clínico em pormenor e aferir o rigor da sua dieta.

Por esse motivo, não.

A doença celíaca é uma patologia autoimune desencadeada pela ingestão de glúten: é sempre necessário que o indivíduo coma alimentos que contenham glúten para que a doença se manifeste.

Existem situações de «reação» da pele após aplicação de produtos cosméticos derivados do trigo, bem como após utilização de tintas de cabelo ou mesmo depois de mexer com as mãos em produtos/alimentos com glúten. Essas manifestações poderão, eventualmente, estar associadas a uma alergia a um dos seus variados componentes, mas isso não equivale a dizer que se é celíaco!

Depende…

A anemia por falta de ferro (chamada anemia ferropénica) é das manifestações mais frequentes da DC, podendo mesmo ser o sinal laboratorial único, numa pessoa sem sintomas, motivando a investigação adequada e consequente diagnóstico. A causa mais frequente de deficiência de ferro no celíaco recém-diagnosticado é a má absorção intestinal por inflamação da parede intestinal. Quer isto dizer que, mesmo que o indivíduo ingira ferro em quantidade suficiente na sua alimentação, enquanto as vilosidades não começarem a recuperar e a absorver adequadamente os nutrientes, a anemia manter-se-à. Só quando o intestino tiver a  sua capacidade de absorção recuperada é que os depósitos de ferro do organismo voltarão ao normal e a anemia desaparecerá. Esta recuperação total ocorre a um ritmo variável – diferente em cada pessoa – mas, na maioria dos casos, demora até um ano, podendo ser útil o reforço do ferro na dieta ou, até, a administração na forma endovenosa.

Caso a recuperação não se processe de forma expectável e se entenda que isso é  adequado clinicamente, devem ser pesquisados outros fatores  que dificultem uma boa evolução. São  disso exemplos a existência de efeitos secundários aos comprimidos de ferro (que impeçam a sua toma nas doses correctas), a prescrição  simultânea de alguns medicamentos que dificultam a absorção do ferro, as hemorragias ginecológicas concomitantes e a perda de sangue do tubo digestivo, de forma visível ou oculta (por exemplo, por úlcera, pólipo, tumor,  doença inflamatória ou hemorróidas). Podem ainda existir outras doenças simultâneas à DC, com inflamação generalizada no organismo e, por isso, chamando o consumo do ferro para si.

Contudo, na primeira linha do pensamento, como hipótese mais provável para uma recuperação mais lenta do que esperado de uma anemia ferropénica, está sempre a suspeita de ingestão de glúten… O não cumprimento dietético, propositado ou involuntário (contaminação), é a principal causa da lenta ou da não recuperação da anemia (e, na verdade, das restantes queixas e alterações laboratoriais) de um celíaco. Assim, é útil que nessas circunstâncias médico e dietista assistentes revejam novamente o caso garantindo o bom cumprimento da dieta.

Sim, é.

A maioria dos celíacos diagnosticados na idade adulta passou um período mais ou menos longo da sua vida sem qualquer queixa. Tinha, portanto, uma doença assintomática (a tal doença «adormecida») que, por não causar qualquer sintoma nem se apresentar com nenhum sinal, permaneceu totalmente despercebida. Embora não se saiba exatamente porquê, a certa altura, o indivíduo pode começar a ter queixas, quer do foro intestinal (cólicas, distensão ou diarreia, por exemplo) quer de outros órgãos (como as articulações, o sistema nervoso, a pele ou o sangue). Assim, uma doença celíaca (DC) assintomática e, por isso, nunca suspeitada, passa a manifestar-se e surge a oportunidade de se fazer  a investigação correta para se chegar ao diagnóstico final.

Respondendo à  questão, na fase em que a DC é assintomática, é possível dela suspeitar caso se realizem as análises dos anticorpos específicos para esta doença. Se forem positivos, dever-se-à realizar endoscopia com biópsia do duodeno que, se demonstrar atrofia, faz o diagnóstico.

Esta  é, muitas vezes, a história da DC nos indivíduos sujeitos a rastreio, nomeadamente por terem um familiar de primeiro grau celíaco  (pai, mãe, irmão ou filho): não têm queixas, sempre foram aparentemente saudáveis e apenas porque tal relação familiar aumenta o seu risco de ter DC em cerca de 20% propõem-se a fazer as análises. Porquê? Porque se forem mesmo celíacos, quanto mais cedo se começarem a tratar, melhor…

Sim.

Embora a DC seja, classicamente, uma doença de crianças (geralmente com queixas clássicas de diarreia crónica, cólicas, distensão abdominal, má-nutrição ou atraso de crescimento) cada vez mais se reconhecem formas no adulto que passam despercebidas nas primeiras décadas de vida. Isso acontece porque a DC tem uma grande diversidade nas suas formas de apresentação clínica, ou seja, nos sinais e sintomas com que se manifesta inicialmente. Para além das formas típicas da doença, com as queixas clássicas já referidas, existem formas de doença que não são imediatamente aparentes, nem para o próprio indivíduo nem para o médico:

  • A DC pode manifestar-se de forma totalmente assintomática ou apenas com um ou outro sintoma não valorizados por ninguém. São formas silenciosas ou quase silenciosas, que persistem durante um período de vida considerável e que perduram ao longo do tempo. São exemplos disso o cansaço isolado e persistente com a  correspondente anemia ligeira (e crónica ao longo da vida); a osteoporose precoce; ou as alterações intestinais, vulgares e inespecíficas, de flatulência, de cólica abdominal e de obstipação. Os indivíduos podem ainda não manifestar qualquer sintoma e ter apenas uma deficiência nutricional detectada nas análises sanguíneas, como a deficiência de ferro, de vitamina B12 ou de ácido fólico.
  • O indivíduo pode ainda ter uma forma de DC classificada como  atípica ou extra-intestinal, com sintomas e sinais que,  à partida, não são de relacionar com uma doença gastrenterológica e, por isso, não chamam facilmente a atenção para o diagnóstico. São disso exemplos algumas doenças da pele (ex: dermite herpetiforme), da tiróide (ex: tiroidite auto-imune) ou do sistema nervoso (ex: dificuldade na marcha).

Podem ter, mas nem sempre as têm… nem as devem ter!

A DC caracteriza-se pela destruição (atrofia) da parede do intestino delgado. Como a absorção dos nutrientes se processa nesse órgão o celíaco pode estar em risco para algumas deficiências nutricionais. As mais frequentes são as deficiências de ferro, ácido fólico e vitamina B12 e o seu rastreio (em análises de sangue) é obrigatório no momento do diagnóstico e ao longo da vigilância de rotina do celíaco. Destaca-se que podem existir carências de vitaminas ou de minerais e não existirem deficiências proteicas nem calóricas: ou seja, um indivíduo pode ser gordo ou não ter emagrecido e, mesmo assim, ter deficiências nutricionais.

Caso se detectem deficiências no momento do diagnóstico, estas devem ser colmatadas na dieta ou através de suplementos (comprimidos ou injectáveis). Caso estas deficiências surjam ao longo do tempo, para além do seu tratamento adequado, deve-se logo levantar a hipótese da doença estar mal controlada por existir ingestão de glúten, voluntariamente ou acidentalmente (contaminação).

Um celíaco controlado deve ter o seu intestino totalmente recuperado e a funcionar em pleno. Neste caso, não deve existir qualquer carência nutricional, sendo fundamental a manutenção de uma dieta isenta de glúten, sempre rica e equilibrada do ponto de vista alimentar.

Sim, pode… desde que não o engula.

Os produtos cosméticos e para a pele ou cabelo, mesmo contendo glúten, não representam problema a não ser que sejam ingeridos. A doença celíaca (DC) é uma doença autoimune desencadeada pela presença de glúten no interior do intestino delgado. Só nesse caso, num celíaco, se desencadeiam as reacções inflamatórias que levam à destruição da parede intestinal e ao aparecimento dos sinais e sintomas que caracterizam a doença. Assim, não há qualquer problema na utilização de produtos com glúten… a não ser que esse produto possa chegar ao contacto da boca e ser ingerido, inadvertidamente. Imaginemos o caso de um batôn para os lábios, de um creme para a cara ou de um champô que se utiliza no duche. É simples prever que pequenas quantidades (mas suficientes para activar a doença) possam ser ingeridas. Para maior segurança, caso a situação se justifique, deve consultar a lista de ingredientes ou contactar o fabricante para maior informação.

Salienta-se que a dermite herpetiforme, uma manifestação cutânea de uma intolerância ao glúten, surge porque há ingestão de glúten e não por contacto deste com a pele. Assim, o tratamento desta doença de pele é, tal como o da doença celíaca, a dieta isenta de glúten. Caso utilize um produto para a pele e este lhe pareça causar inflamação local ou qualquer tipo de reacção cutânea contacte o seu médico assistente ou dermatologista: pode ser uma alergia a um componente desse produto mas não será uma manifestação da DC.

2014

Não necessariamente.

A intolerância à lactose é uma situação em que não se consegue digerir a lactose (um açúcar presente no leite dos mamíferos), por falta de uma enzima, a lactase. É uma doença muito frequente e vulgar, que pode aparecer ao longo da vida (mais precoce ou mais tardiamente) e que raramente representa uma situação grave. Os seus sintomas (cólicas, diarreia, flatulência e distensão abdominal) confundem-se com os da DC, podendo tornar-se um problema adicional para o celíaco.

Na verdade, não parece existir maior frequência de intolerância ao açúcar do leite nos indivíduos celíacos. Contudo, como a lactase (a tal proteína necessária para digerir a lactose) se localiza ao nível das vilosidades intestinais, enquanto a DC não estiver controlada e o intestino não recuperar pode existir deficiência de lactase e, por isso, intolerância à lactose. Quando se verificar a recuperação total das vilosidades é possível que o celíaco possa consumir lactose novamente, sem problemas.

É assim frequente aconselhar um celíaco recém diagnosticado e com sintomas a não consumir lactose e, mais tarde, quando estiver bem, reintroduzi-la na sua alimentação. O aparecimento de queixas associadas à ingestão de lactose permitirá fazer o diagnóstico e até perceber qual o volume de lactose tolerado por aquele indivíduo.

Depende…

Muitos celíacos não têm qualquer percepção de que ingeriram glúten: simplesmente não notam nada de diferente no seu corpo quando transgridem a dieta, mas isso não significa que essa ingestão de glúten não tenha consequências.  Silenciosamente, o glúten vai promovendo a destruição das vilosidades e exercendo o seu impacto negativo em vários órgãos e sistemas do organismo.

Contudo, há celíacos que têm a sensação de que ingeriram glúten: têm sintomas, bem definidos ou vagos,  que podem ser semelhantes ou diferentes daqueles que levaram ao diagnóstico. Há relatos, após ingestão de glúten, de sintomas típicos da DC (cólicas, diarreia, flatulência e distensão abdominal) bem como de queixas variadas (como por exemplo as de refluxo gastro-esofágico, de insónias, de lesões da pele) ou de, simplesmente, um cansaço ou mal-estar geral pouco definido. Um celíaco pode perceber que o seu organismo reage sempre com determinado padrão e de forma semelhante, aprendendo então a reconhecê-lo. No entanto, não é certo que sempre que se coma glúten que essas queixas apareçam – não se pode confiar em qualquer sintoma como indicador fiável de que se comeu glúten. Assim, são fundamentais todos os cuidados na manutenção da dieta isenta de glúten.

Sim, faz mal.

A doença celíaca (DC) obriga ao rigoroso cumprimento, sem exceção, de uma dieta isenta de glúten. O glúten, no intestino de um celíaco, vai estimular o sistema imunitário ativando  reações autoimunes que têm como um dos objetivos a destruição das células intestinais. O que se observa, ao microscópio, nas biopsias do intestino de um celíaco é o resultado dessa destruição de células intestinais: a atrofia intestinal, que é característica da DC.

A estimulação surge quando as células do sistema imunitário entram em contacto com partículas de glúten na parede intestinal. Esse contacto não é necessariamente dependente do volume de glúten ingerido. Isto significa que uma ínfima e minúscula porção de glúten pode ter a capacidade e o potencial de despertar a autoimunidade e promover a destruição intestinal em larga escala. Assim sendo: glúten, zero!  Sempre.

Sim, deve.

Reconhece-se que a DC é uma patologia de incidência familiar, resultado da partilha dos genes entre pessoas aparentadas. A probabilidade de um familiar de primeiro grau de um celíaco (pai, mãe, irmãos ou filhos) ter DC é de cerca de 10%. Isto justifica a realização de um rastreio que é, na maioria dos casos, feito por serologia (análises de sangue).

Assim, mesmo nas crianças saudáveis, não apresentando qualquer queixa, esse rastreio da DC está recomendado caso um dos pais ou um irmão seja celíaco. Não esquecer que a DC pode cursar durante anos com queixas mínimas e ligeiras ou instalar-se como doença assintomática e silenciosa, sendo o diagnóstico precoce fundamental para evitar o impacto negativo desta patologia ao longo do tempo.

Não obrigatoriamente. Mas deve ser regularmente acompanhada pelo médico.

O diagnóstico de doença celíaca permite, com a manutenção rigorosa da dieta isenta de glúten (DIG), a recuperação do intestino delgado e a normalização das deficiências nutricionais porventura existentes. O celíaco sente-se progressivamente melhor, notando o desaparecimento das queixas que o afligiam e, curiosamente, dando conta de que outros sintomas que não valorizava acabaram por melhorar ou desaparecer. Caso o indivíduo tenha doenças de outros órgãos associadas à sua doença celíaca (tiróide, pele ou articulações, por exemplo), com o início da DIG notar-se-á provavelmente uma melhoria ou um melhor controlo dessas outras patologias. Este processo de recuperação pode ser lento e deve ser acompanhado e monitorizado pelo médico e pelo dietista.

Embora não existam regras definitivas, o programa de seguimento médico de um celíaco depende de vários fatores: idade de diagnóstico, gravidade dos sintomas nessa altura, evolução clínica ao longo do tempo e queixas atuais; existência de doenças associadas ou de complicações de doença celíaca; magnitude das alterações nos exames complementares de diagnóstico; cumprimento e complicações da DIG (aumento de peso, emagrecimento ou obstipação, por exemplo).

Na presença de um celíaco diagnosticado há anos, sem queixas clínicas e com um ótimo controlo dietético, sugere-se uma visita anual ao seu médico e dietista. Na consulta, esses profissionais apercebem-se do estado clínico e nutricional do indivíduo, salientando pormenores porventura não valorizados e atribuindo-lhes, ou não, importância. Ir à consulta não significa, necessariamente, ter que realizar exames médicos mais complexos como a endoscopia, embora se considere rotina o pedido de análises sanguíneas. Contudo, caso seja considerada útil a prescrição de qualquer exame, a sua solicitação é sempre personalizada e feita, como referido, de acordo com o contexto geral do celíaco.

2020

A doença celíaca é uma patologia diversificada que, como qualquer outra, inclui grupos diversos de doentes, com gravidade e características diferentes. No que se refere ao risco de um doente celíaco se infectar com o vírus SARS-CoV-2, causador da doença covido-19, não se pode generalizar e, de acordo com a informação científica actualmente disponível, há que considerar 2 grupos:

a) os celíacos controlados e sem risco aumentado

A doença celíaca controlada, apesar de ser uma doença crónica, não é habitualmente considerada debilitante nem causadora de imunodeficiência (mau funcionamento do sistema imunitário). Assim, não existe, até ao momento, qualquer informação de que um celíaco controlado estará em maior risco de contrair covid-19. Os celíacos controlados devem seguir, como o resto da população, as recomendações gerais das autoridades de saúde, que salientam a importância do distanciamento social, da utilização de máscara facial, da etiqueta respiratória e da desinfecção/lavagem frequente das mãos. Adicionalmente devem manter o rigor da sua dieta isenta de glúten sabendo-se que o contacto inadvertido ou a contaminação com glúten não os coloca automaticamente no grupo de risco.

b) os celíacos com risco aumentado

Pertencem a este grupo os celíacos que:

  • tenham pelo menos 60 anos;
  • tenham a sua doença não controlada, ou seja, doença ativa. São os celíacos sintomáticos (com queixas), emagrecimento, malnutridos, com evidentes alterações nas análises ou noutros exames complementares;
  • apresentem complicações da doença, nomeadamente doença celíaca refractária;
  • estejam a ser tratados com imunossupressores, que são medicamentos que alteram a capacidade de o sistema imunitário combater as infeções. São exemplos destes fármacos a cortisona, a azatioprina e um conjunto de medicamentos genericamente chamados “fármacos biológicos”;
  • apesar de estarem controlados, tenham outras doenças que os colocam em risco para a covid-19 como, por exemplo, a diabetes, a doença cardiovascular (hipertensão, risco atual de ou história passada de enfarto do miocárdio ou cerebral – vulgarmente chamado AVC), a doença respiratória (doença pulmonar obstrutiva crónica) ou o cancro.

Estes celíacos são considerados de risco e, por isso, devem recorrer ao seu médico assistente para melhor esclarecimento e orientação. Globalmente deverão ter cuidados ainda mais meticulosos no que se refere às medidas de contenção da infecção e poderão beneficiar de atitudes mais restritas de isolamento social (de acordo com a evolução da pandemia) bem como da proteção conferida pela vacinação profilática contra a gripe sazonal e contra outras infecções bacterianas.

Em Portugal, deve ser rigorosamente cumprido o calendário das vacinas estipulado no Plano Nacional de Vacinação. A questão levantada coloca-se em relação a vacinas não contempladas nesse plano, portanto, vacinas consideradas extra. E quanto a isso, não há consenso internacional sobre os conselhos a dar aos celíacos, considerando unicamente a doença celíaca como factor de risco.

Existe uma situação específica no celíaco que justifica a prescrição de algumas vacinas não consideradas no plano de vacinação: o hipoesplenismo. É um facto reconhecido que uma minoria (cerca de 30%) dos celíacos podem ter uma diminuição da função do baço, chamada hipoesplenismo. O baço é um órgão do sistema linfático que participa no bom funcionamento do sistema imunitário e das defesas do organismo. Entre os celíacos cujo baço não funciona a 100% – os tais que têm hipoesplenismo –, apenas uma pequena fração tem repercussão disso na sua vida: esses terão um aumento da suscetibilidade a algumas infeções bacterianas, originando septicémia, pneumonia ou meningite. Como existem actualmente vacinas eficazes para alguns desses microorganismos, os celíacos com hipoesplenismo podem ser vacinados com as vacinas antipneumococo (vulgo vacina da pneumonia), antimeningococo (vulgar vacina da meningite) e anti-hemophilus.  Nestes indivíduos é também aconselhada a vacinação anual da gripe, não porque tenham maior probabilidade de contrair essa doença viral, mas porque a própria gripe pode complicar-se por infecções bacterianas secundárias, que se aproveitam assim do estado de fragilidade do organismo.

A dificuldade na prática corrente é como saber se um celíaco, mesmo controlado, tem ou não deficiente funcionamento do baço, ou seja, hipoesplenismo. Isso pode não ser fácil de concluir, uma vez que não existe um único exame ou teste que o sugira ou negue com um bom grau de fiabilidade. Existem alguns exames complementares que o médico pode solicitar e que podem indicar a existência de hipoesplenia e, então, sugerir a tal necessidade de vacinação suplementar. Essas decisões (de estudar a função do baço e/ou vacinar um celíaco) nem sempre são consensuais entre os médicos e devem ser discutidas entre o celíaco e o seu clínico assistente.

De qualquer forma, como exemplificado na questão anterior, não esquecer que mesmo um celíaco controlado e com função do baço normal pode ser considerado de risco para determinadas infeções apenas face à sua idade ou simplesmente por ter outras doenças. Nessa situação, poderá efetivamente beneficiar de vacinação além da prevista pelo Plano Nacional de Vacinação.

A medula óssea é o tecido esponjoso que se localiza no interior dos ossos. Na sua composição incluem-se células que têm a capacidade de se multiplicar e dar origem a diferentes constituintes do sangue. É aí que se “fabricam” as células que circulam nos vasos sanguíneos, nomeadamente os glóbulos vermelhos (que transportam o oxigénio a todas as outras células do organismo), os glóbulos brancos (que, entre outras funções, nos protegem de infeções) e as plaquetas (que são fundamentais para a nossa coagulação). Na presença de uma doença ou situação que afecte gravemente o funcionamento da medula (cancro, infeção, alterações do metabolismo logo à nascença ou em resultado de quimioterapia ou radioterapia, por exemplo) os indivíduos podem manifestar sintomas variados relativos a deficiências das células sanguíneas, como por exemplo, anemia, infeções recorrentes ou hemorragias graves. Estas manifestações por deficiência da função medular podem ser graves e eventualmente fatais.

O transplante de medula é um tratamento que permite substituir a medula óssea doente por outra saudável. O transplante pode ser autólogo (quando se utiliza medula do próprio doente, previamente recolhida e guardada, como por exemplo antes de um tratamento de quimioterapia ou radioterapia) ou alogénico (feito com medula de uma outra pessoa, dadora).  Em qualquer uma das circunstâncias pretende-se que células saudáveis de medula se fixem na medula do indivíduo doente, multiplicando-se e curando-o ao restituir a sua capacidade de produzir sangue.

O procedimento médico é complexo e exigente, e o primeiro passo, no caso do transplante com células de outra pessoa, é encontrar alguém adequado – é necessário um dador que, após estudo e comparação do seu sistema imunitário com o do recetor (quem recebe o transplante), se revele compatível. Ao reconstituir do princípio o sistema imunitário, a intenção é reduzir a hipótese de as células do dador reconhecerem os órgãos do recetor como estranhos e atacarem-nas irreversivelmente.

Os critérios para alguém se inscrever como dador de medula variam um pouco em todo o mundo, mas, regra geral, ter uma doença auto-imune poderá ser mesmo limitante. Por um lado, o procedimento médico a que o dador é habitualmente sujeito antes da recolha da sua medula para doação poderá agravar a doença autoimune existente. Por outro lado, a doença autoimune no dador poderá ser causa de complicações no recetor.

Os celíacos, em Portugal, e de acordo com as regras do Instituto Português do Sangue e Transplantação (IPST), não podem doar medula óssea. A doença celíaca é um critério de exclusão de admissão para doação de medula. Está incluída numa lista variada, de que são exemplos a diabetes, a fibromialgia, o glaucoma ou ter tido hepatite B ou C.

No entanto, no que se refere à dádiva de sangue por celíacos, segundo o IPST e em comparação com a doação de medula, as regras não são tão estritas. Embora a doença celíaca seja uma doença autoimune, não está definitivamente negada a doação de sangue. O ser considerado “Apto” vai depender da avaliação médica efetuada no momento da dádiva, considerando a situação clínica (pretende-se um celíaco assintomático, controlado e saudável) e a terapêutica (uma dieta rigorosa isenta de glúten). Para essa avaliação médica poderá ser útil um relatório do médico assistente com um resumo clínico atualizado da situação do celíaco.

Provavelmente sim, caso a dieta esteja a ser rigorosamente cumprida.

Logo após a certeza do diagnóstico, o celíaco deve iniciar uma dieta isenta de glúten. Aprender a cumprir rigorosamente uma dieta com estas características pode não ser fácil e, também por isso, deve ser mantido um acompanhamento regular pelo nutricionista. Ao retirar o glúten da alimentação, deixa de existir ativação do sistema imunitário e, por isso, reduz-se progressivamente o processo inflamatório que está na base da destruição da mucosa do intestino delgado. Isto significa que logo que se inicia a dieta o organismo começará a recuperar. Alguns sintomas podem melhorar muito rapidamente (por vezes, passados alguns dias, nota-se melhoria no cansaço, na falta de forças e de energia vital) mas outros podem demorar mais tempo – por exemplo, a diarreia, a distensão abdominal e as cólicas podem apenas melhorar significativamente depois de algumas semanas. Ao mesmo tempo, os valores laboratoriais que estavam alterados – por exemplo, anemia, vitamina B12, cálcio e ferro baixos ou análises hepáticas aumentadas – têm tendência para recuperar progressivamente, reflectindo a tendência para melhoria sentida pelo celíaco.

Após iniciar a dieta isenta de glúten e acompanhando a melhoria dos sintomas e das análises gerais, observa-se uma redução dos anticorpos sanguíneos característicos da doença celíaca, nomeadamente do anticorpo transglutaminase tissular-IgA (TGT), um dos mais utilizados no estudo dos celíacos. Em cerca de 90% dos celíacos estes anticorpos são positivos e podem ser considerados, grosseiramente, uma medida da atividade inflamatória causada pelo glúten. Ora, se a dieta for cumprida, é de esperar que o seu valor no sangue reduza progressivamente.  Esta diminuição pode ser mais evidente de pessoa para pessoa, mas, na maioria dos indivíduos, os anticorpos ficam negativos ao final de um ano de dieta rigorosa.

Contudo temos que considerar duas situações:

  • Cerca de 10% dos celíacos que tinham os anticorpos elevados no momento do diagnóstico e que cumprem uma dieta rigorosa nunca conseguirão negativá-los – podem reduzir bastante o seu valor, mas serão sempre positivos. E isso acontece sem querer significar que o intestino não recupere totalmente da sua atrofia.
  • Há celíacos cujos anticorpos apesar de se tornarem negativos não têm uma recuperação total do intestino.

Por esses motivos – poderem existir celíacos positivos com intestino recuperado e celíacos negativos ainda com inflamação intestinal – é importante realizar um controlo por endoscopia com repetição das biópsias do duodeno/intestino delgado. A melhor altura para repetir essa endoscopia varia conforme o caso, mas, habitualmente, aguarda-se, pelo menos, por 1 ano de rigorosa dieta isenta de glúten.

Nunca acreditar que “se comer glúten, eu sinto logo”…

A reação de um celíaco sob dieta isenta a uma ingestão de glúten, vulgarmente chamada “glutenização” (acidental ou por contaminação), pode variar conforme o indivíduo:

Alguns ingerem glúten e sentem passados minutos ou horas sintomas que podem ser variados, mas que, geralmente, na mesma pessoa mantêm o mesmo padrão: má disposição geral, náuseas, vómitos, diarreia, cólicas ou flatulência, por exemplo; Outros, ao ingerir glúten não têm qualquer sintoma – o que os pode levar à conclusão falsa e perigosa de que “afinal, não me faz mal!” Há também celíacos que apenas referem sintomas se o volume de glúten ingerido for superior a determinada quantidade, nem sempre, aparentemente, a mesma é variável de pessoa para pessoa… Porque a variabilidade das reações à “glutenização” é grande, há que manter o rigor na dieta isenta de glúten e não cair no erro de que a sua alimentação “está bem controlada porque não sinto nada, e se comer glúten percebo imediatamente!”

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